A 3ª Turma Recursal do TJDFT confirmou sentença do 2º Juizado Cível de Sobradinho que condenou escritório de advocacia (Reale Sociedade Individual de Advocacia EPP) a suspender cobranças via telefone para os autores, bem como a indenizá-los pelos danos morais decorrentes de tais ações. A decisão foi unânime.
Os autores alegam que a ré tem agido de forma abusiva ao realizar inúmeras ligações telefônicas diárias, em horários inoportunos e em números de celular de trabalho, relativas à cobrança de financiamento fraudulento de veículo, cujo débito já foi declarado inexistente por sentença transitada em julgado. Destacam que, embora expliquem a situação aos prepostos da ré e peçam para cessarem as ligações, suas solicitações não são atendidas. Relatam que as ligações diárias e em horários inapropriados têm afetado sua paz, sossego e até mesmo o trabalho do segundo autor, que depende da linha para atender seus clientes.
A ré, por sua vez, sustenta ilegitimidade passiva, uma vez que agiu como mera mandatária da instituição financeira credora, no caso a BV FINANCEIRA SA, que enviou o contrato para cobrança e não lhe comunicou o resultado da ação judicial em curso. Destaca que, ante a ausência de informações da credora, em seus registros o primeiro autor permanecia em inadimplência. Afirma que o segundo autor, indicado pelo primeiro como seu advogado, negou-se a enviar as documentações solicitadas a respeito do processo para que se procedesse a devida baixa e que sempre realizou as ligações em horários autorizados, sendo que seus prepostos eram cordiais com os autores.
Inicialmente, o juiz explica que, no presente caso, a ré também é parte legítima a responder a ação, porque embora se apresente como mandatária da primeira, pode, também nessa qualidade, vir a ser responsabilizada pessoalmente caso seus atos extrapolem os poderes conferidos pelo contrato/mandato, nos termos do art. 633 do Código Civil. E acrescenta: “Em que pese a demandada alegar que agia como mera mandatária da instituição financeira credora, não trouxe aos autos nenhuma prova nesse sentido. A ré não juntou ao processo o apontado contrato de mandato que aponta como fundamento e justificativa de suas ações de cobrança, que, pelo que dos autos consta, eram diuturnas, diárias e praticamente incessantes. Dessa forma, não há comprovação bastante de que a requerida era, tão somente, mandatária da aludida instituição financeira, ou se agiu na qualidade de cessionária do crédito”.
“No que tange à apontada falta de conhecimento da ação judicial que declarou inexistente o débito, também esse argumento de defesa se mostra frágil e impróprio ao fim que se destina”, diz o juiz, visto que a ré “detém conhecimento técnico e profissionais capacitados para realização de consultas processuais a respeito da situação dos contratos que administra”.
Assim, uma vez caracterizado o dano moral, o magistrado julgou procedentes os pedidos dos autores para: a) DETERMINAR que a ré se abstenha de realizar novas ligações de cobrança aos números dos autores, e de com eles manter contato sob qualquer meio, a respeito do contrato de financiamento mantido com a BV FINANCEIRA, cujo débito já foi declarado inexistente por sentença transitada em julgado, sob pena de multa de R$ 1 mil por ligação ou contato efetuado em desobediência à decisão; e b) CONDENAR a ré ao pagamento de compensação por danos morais no montante de R$ 2 mil, para cada um dos autores, com correção monetária e juros moratórios.
Os autores recorreram a fim de majorar o valor indenizatório, e a parte ré, a fim de desconstituir a sentença. O Colegiado, no entanto, negou provimento ao recurso dos autores, por entender que “o valor fixado mostra-se condizente à estimativa firmada pelas Turmas Recursais do DF e às circunstâncias do caso concreto”, e não conheceu o recurso da ré, uma vez constatada a irregularidade da representação processual.
AB
Processo: 2016.06.1.009091-8 – Sentença / Acórdão
Fonte: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT
Ementa:
PROCESSO CIVIL. CIVIL. CONSUMIDOR. Danos morais decorrentes de cobrança abusiva (constantes telefonemas e mensagens, em horários inoportunos e em números de celular de trabalho, relativas a contrato de financiamento, fraudulentamente firmado em nome do primeiro autor, e cujo débito foi declarado inexistente por sentença transitada em julgado). I. Recurso de REALE SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA EPP não conhecido. Constatada a irregularidade da representação processual (inexistência de instrumento procuratório apto a conferir validade ao substabelecimento de fls. 700, uma vez apócrifa a procuração de fls. 652/653), e não sanado o defeito por ocasião da específica determinação nesse sentido, na parte final da sentença (fls. 671, verso), tampouco por ocasião da intimação por este órgão revisor (CPC, Art. 932, parágrafo único), é de se negar seguimento ao recurso da parte requerida (CPC, Art. 932, III). II. Recurso dos autores, em que pretendem a majoração do valor fixado a título de reparação por danos morais (R$ 2.000,00 para cada). Em que pese o inconteste aborrecimento decorrente das ligações e das mensagens de cobrança, ausente demonstração de exposição dos recorrentes a outras situações externas vexatórias ou mais gravosas, a subsidiar a pretendida majoração do quantum da reparação. Com efeito, o valor fixado mostra-se condizente à estimativa firmada pelas Turmas Recursais do DF (1ª TR, Acórdão n.972564DJE: 24/10/2016; 3ª TR, Acórdão 965755, DJE 20.09.2016) e às circunstâncias do caso concreto (ausente prova de ameaças ou de linguajar desrespeitoso nas mensagens de cobrança; termos razoáveis das mensagens eletrônicas e por celular; registro de chamadas “não atendidas”; telefone do segundo recorrente fornecido pelo próprio primeiro recorrente, para que, como advogado, “explicasse melhor a real situação do processo que havia movido contra a instituição financeira” – fl. 6), além de suficiente a compensar os dissabores vivenciados, a par da extensão dos danos evidenciados (CC, Art. 944). Recurso de REALE SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA EPP não conhecido. Recurso de JEOVANE ANTONIO DE MATOS e MARCELO DE SOUSA VIEIRA conhecido e improvido. Sentença confirmada por seus fundamentos (Lei n. 9099/95, Art. 46). Cada parte arcará com os honorários de seus advogados. Custas pro rata. (Acórdão n.986214, 20160610090918ACJ, Relator: FERNANDO ANTONIO TAVERNARD LIMA 3ª Turma Recursal, Data de Julgamento: 06/12/2016, Publicado no DJE: 12/12/2016. Pág.: 344/356)