A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a nulidade do pedido de demissão de uma operadora de caixa, que, acusada por uma sócia da AG Carrara Calçados e Bolsas Ltda. ME de realizar compra irregular, se despediu sob a pena de “ir para a delegacia”. De acordo com a ministra Delaíde Miranda Arantes, relatora do processo, a ameaça configurou abuso de direito por parte do empregador.
A sócia disse que a operadora realizou compras para si, com prazos e descontos não ofertados aos clientes em geral. Ao requerer explicações da empregada sobre o erro, a representante da loja exigiu a assinatura do pedido de demissão, senão acionaria a polícia. A caixa cumpriu a ordem, mas apresentou reclamação trabalhista para pedir a conversão da despedida em dispensa imotivada por iniciativa do empregador, com o pagamento das respectivas verbas rescisórias.
Em sua defesa, a empresa de calçados alegou que a trabalhadora solicitou o rompimento do contrato espontaneamente, quando não conseguiu explicar o equívoco.
O juízo da 3ª Vara do Trabalho de Diadema (SP) julgou improcedente a ação, por entender que não ficou comprovada a coação. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), para quem a empresa tem direito de apurar suposto crime em sua loja, inclusive com ajuda policial.
Apesar de não alterar a conclusão do juiz, o TRT validou depoimento de testemunha, no sentido de que viu a chefe pressionar a colega “a falar alguma coisa que não tinha feito”, e acusar o gerente e a caixa de realizar compras não registradas no sistema. Ela também relatou que a operadora “foi obrigada a pedir demissão, caso o contrário, iria para a delegacia”.
TST
Relatora do recurso da operadora de caixa ao TST, a ministra Delaíde Arantes disse que a testemunha comprovou a coação, ao revelar a ameaça feita pela empresa para conseguir o objetivo de despedir a trabalhadora, atitude que, “muito além de configurar exercício regular de direito, se caracteriza como patente abuso de poder”, afirmou. Ela destacou que não houve prova de atitude ilícita cometida pela empregada.
A ministra destacou a liberdade do empregador de procurar a polícia, mas disse que a ameaça, “além de extrapolar o poder patronal, retira a espontaneidade da manifestação de vontade, elemento necessário para a configuração do pedido de demissão”. Segundo a relatora, houve vício na manifestação de vontade, nos termos do artigo 151 do Código Civil, portanto a Turma proveu o recurso para condenar a Carrara ao pagamento das verbas rescisórias decorrentes da dispensa sem justa causa.
A decisão foi unânime.
(Lourdes Côrtes/GS)
Processo: RR-1202-32.2014.5.02.026