Os valores são referentes aos benefícios de auxílio-doença e pensão por morte pagos a pessoas que trabalhavam no local na noite da tragédia
Os 4 (quatro) ex-sócios da Boate Kiss, o ex-chefe de segurança e a empresa Santo Entretenimento terão que ressarcir o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pelos valores que foram gastos com auxílio-doença e pensão por morte de funcionários que trabalhavam na casa noturna no dia da tragédia, ocorrida em 27 de janeiro de 2013.
Por unanimidade, a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou o recurso de apelação de Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Londero Hoffman, Marlene Terezinha Callegaro, Ângela Aurélia Callegaro, Everton Drusião e da empresa proprietária da Kiss.
A ação regressiva foi ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pugnando pela responsabilização dos demandados e o ressarcimento dos benefícios pagos a 17 (dezessete) trabalhadores, 12 (doze) com auxílio-doença e 5 (cinco) com pensão por morte. De acordo com o INSS, os segurados teriam sido vítimas de acidente de trabalho decorrente da negligência dos demandados, face o descumprimento de normas de segurança do trabalho.
Em junho do ano de 2016, a 2ª Vara Federal de Santa Maria (RS) condenou os demandados a ressarcirem o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de forma solidária, sob o entendimento de que teriam agido com negligência. Até o ajuizamento da ação, em julho de 2013, o montante pago era de R$ 68 mil. Os réus apelaram ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).
Os demandados sustentaram que possuíam todos os alvarás e licenças obrigatórios para o funcionamento da boate e que caso os equipamentos de segurança viessem a ser considerados insuficientes, os responsabilizados deveriam ser o município de Santa Maria, o Corpo de Bombeiros, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do RS (CREA/RS) e a empresa de segurança terceirizada.
O município de Santa Maria porque de acordo com o Código de Obras e Edificações de Santa Maria, os “clubes sociais”, tais como “boates e clubes noturnos em geral”, podem ter lotação de duas pessoas por metro quadrado, ou seja, a Boate Kiss poderia comportar até 1.382 pessoas, havendo 874 presentes na noite que ocorreu o incêndio.
O Corpo de Bombeiros porque não teria exigido que o estabelecimento tivesse duas saídas para casos de emergência ou sinalização luminosa diversa daquela que foi instalada no local. Destacaram que a espuma no teto da boate foi instalada em virtude da insuficiência do isolamento acústico com base em projeto realizado por engenheiro e que nunca teriam sido alertados sobre a inadequação do material. Quanto aos extintores de incêndio, ressaltaram que eram em número suficiente e que parte das mortes ocorridas naquele dia teria decorrido da atuação negligente dos bombeiros, que teriam deixado que civis ingressassem no local para auxiliar na remoção das vítimas que estavam dentro da Boate Kiss.
Ainda sustentaram que os seguranças da boate eram terceirizados e a responsabilidade pelo treinamento em caso de incêndio caberia à empresa contratante, e que o CREA não teria fiscalizado a obra das reformas da Boate Kiss.
De acordo com o relator do caso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), desembargador federal Luiz Alberto d’Azevedo Aurvalle, restou comprovado que o estabelecimento estava funcionando com alvará vencido, que a lotação era superior à capacidade do local, que o número de portas de saída era insuficiente para o contingente de frequentadores, que não havia sinalização adequada, que os materiais de revestimento eram inadequados e que os extintores de incêndio eram inoperantes. “Está comprovado que os atos concretos dos réus culminaram no sinistro”, destacou o desembargador em relação aos ex-sócios da Boate Kiss.
Quanto ao ex-chefe da segurança Everton Drusião, o desembargador federal Luiz Alberto d’Azevedo Aurvalle confirmou a condenação solidária. “Sua responsabilidade recai sobre o pessoal da segurança que não tinha treinamento adequado, em especial em casos de incêndio/tumulto, sobre práticas de prevenção”.
O Mauro Hoffman afirmou que teria passado suas quotas societárias para Marlene e Ângela Callegaro só não tendo feito o registro. A afirmação foi considerada pelo desembargador federal Luiz Alberto d’Azevedo Aurvalle como “claro intuito de evitar a responsabilização civil”. O relator destacou que restou provado que ele gerenciava os negócios, em especial em grandes eventos, devendo arcar com as consequências de sócio e administrador do local.
O pedido de caução feito pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi negado pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Consoante o relator do processo, esse tipo de medida cautelar só é determinada em casos de obrigação de natureza alimentar, quando serve de garantia de subsistência.
Processo: 5004784-63.2013.4.04.7102/TRF
(Com informações do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4))
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA.
A constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 restou reconhecida por esta Corte, nos autos da Argüição de Inconstitucionalidade na AC nº 1998.04.01.023654-8. Portanto, se o benefício é custeado pelo INSS, este é titular de ação regressiva contra o responsável negligente, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, sem que tal previsão normativa ofenda a Constituição Federal.
O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas àquela destinada ao seguro de acidente de trabalho – SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.
O artigo 120 da Lei nº 8.213/91 é claro ao vincular o direito de regresso da autarquia previdenciária à comprovação da negligência por parte do empregador quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, indicadas para a proteção individual e coletiva.
No caso concreto restou comprovado que o estabelecimento (boate) estava funcionando com alvará vencido, que a lotação era superior à capacidade do local, que o número de saída era insuficiente para o contingente de frequentadores, que não havia saídas alternativas, nem sinalização adequada, bem como o uso inadequado de materiais de revestimento do prédio, sem projetos e execução de profissional habilitado, extintores de incêndio inoperantes, portanto comprovado atos conretos dos réus que culminaram no sinistro.
No que tange a alegação da empresa (Everton Drusião) de que não possuía gerência sobre a tomadora dos serviços tal fato é irrelevante, pois sua responsabilidade recai sobre o pessoal da segurança que não tinham treinamento adequado, em especial em casos de incêndio/tumulto, sobre práticas de prevenção (manuseio extintor incêndio/mangueiras de água), portanto resta caracterizado sua responsabilidade solidária na condenação.
Em relação a alegação do apelante Mauro cabe apontar que restou demostrado que ele figurava como cessionário de 50% das quotas das sócias Marlene e Ângela na empresa (Santo Ent. Ltda), que só não levou a registro em razão da existência de uma ação civil pública que exigia reformas estruturais do prédio, com claro intuito de evitar ser responsabilizado civilmente, bem como restou comprovado que gerenciava o negócios, em especial em grandes eventos, portanto cabe arcar com as consequências de sócio e administrador do local.
(TRF4 – APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004784-63.2013.4.04.7102/RS RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE APELANTE: MARLENE TEREZINHA CALLEGARO (RÉU) APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (AUTOR) APELANTE: ELISSANDRO CALLEGARO SPOHR (RÉU) APELANTE: MAURO LONDERO HOFFMANN (RÉU) APELANTE: ANGELA AURELIA CALLEGARO (RÉU) APELANTE: EVERTON DRUSIAO – ME (RÉU) APELANTE: SANTO ENTRETENIMENTOS LTDA – ME (SOCIEDADE) (RÉU) APELADO: OS MESMOS. Data do Julgamento: 04 de abril de 2018).