Justiça derruba lei que proibia consumo de bebida alcoólica em logradouros públicos

Data:

Justiça derruba lei que proibia consumo de bebida alcoólica em logradouros públicos
Créditos: vladwel / Shutterstock.com

O Órgão Especial do TJSC julgou procedente ação direta de inconstitucionalidade promovida pelo Ministério Público contra a Lei Municipal n. 4666/2010, de Canoinhas, que proibia o consumo de bebidas alcoólicas de qualquer graduação em logradouros públicos daquela cidade. A referida lei, de origem parlamentar, ainda impunha ao prefeito a obrigação de firmar convênio específico com a polícia militar para garantir seu cumprimento e coibir eventuais abusos.

A legislação foi considerada inconstitucional por dois motivos: ofensa ao princípio da separação dos poderes e restrição ao direito de liberdade individual. O desembargador Jaime Ramos, relator da matéria, considerou que o texto representa indevida interferência em atos de gestão e administração do chefe do Executivo municipal, sem contar que atribui obrigações à polícia militar, subordinada em verdade ao governo do Estado. Disse ainda que não é proporcional nem razoável a lei que, a pretexto de garantir maior segurança, proíbe o consumo de bebidas alcoólicas em logradouros públicos.

“[A lei] restringe o direito de liberdade individual, sobretudo porque a ingestão moderada de bebida alcoólica, além de ser lícita, é socialmente aceita e tolerada e […] o consumo excessivo é reprimido por dispositivos legais mais eficazes”, concluiu. Eram considerados logradouros públicos, para efeitos da lei, praças, calçadões, calçadas, passagens, caminhos, ruas, avenidas, rodovias, áreas no entorno de campos de futebol e ginásio de esportes entre outros. A decisão foi unânime (Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 8000075-98.2016.8.24.0000 – Acórdão).

Responsável: Ângelo Medeiros – Reg. Prof.: SC00445 (JP)
Textos: Américo Wisbeck, Ângelo Medeiros, Daniela Pacheco Costa e Sandra de Araujo
Fonte: Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC

Ementa:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI N. 4.666/2010, DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS, DE INICIATIVA PARLAMENTAR, QUE PROÍBE O CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS DE QUALQUER GRADUAÇÃO EM CERTOS LOGRADOUROS PÚBLICOS MUNICIPAIS (ARTS. 1º E 2º) E IMPÕE AO PREFEITO A OBRIGAÇÃO DE FIRMAR CONVÊNIO COM A POLÍCIA MILITAR PARA FISCALIZAR O CUMPRIMENTO DA LEI (ART. 3º) – INDEVIDA INTERFERÊNCIA EM ATOS DE GESTÃO E ADMINISTRAÇÃO DO CHEFE DO EXECUTIVO MUNICIPAL – OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO E INDEPENDÊNCIA DOS PODERES (ART. 32, DA CE/1989) – ATRIBUIÇÃO DE OBRIGAÇÕES À POLÍCIA MILITAR QUE É SUBORDINADA AO GOVERNADOR DO ESTADO (ART. 4º) – OFENSA AO PRINCÍPIO FEDERATIVO (ART. 1º E 107, DA CE/1989) – PROIBIÇÃO DO CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS EM LOGRADOUROS PÚBLICOS QUE, A PRETEXTO DE GARANTIR MAIOR SEGURANÇA, RESTRINGE O DIREITO DE LIBERDADE INDIVIDUAL – OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI N. 4.666/2010, DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS – EFEITOS EX TUNC E ERGA OMNES. A lei, de iniciativa parlamentar, que impõe ao Poder Executivo a prática de atos de gestão – firmar convênio com a Polícia Militar do Estado de Santa Catarina “para a fiscalização do cumprimento” da Lei n. 4.666/2010, do Município de Canoinhas (art. 3º) -, é inconstitucional porque viola o princípio constitucional da separação e independência dos poderes (art. 32, caput, da CE/1989). O Município, nos termos do art. 112, inciso I, da Constituição Estadual, tem competência para “legislar sobre assuntos de interesse local”, mas não tem para interferir na organização do serviço público estadual, nem impor obrigações à Polícia Militar do Estado de Santa Catarina, daí por que a Lei n. 4.666/2010, do Município de Canoinhas, ao dizer que “a autoridade policial que flagrar o descumprimento da Lei, determinará ao infrator que cesse a conduta, lavrando termo, tomando as medidas penais cabíveis em caso de descumprimento” (art. 4º), invadiu a competência privativa do Estado de Santa Catarina para organizar e definir as atribuições da Polícia Militar, violando, assim, o art. 1º (princípio federativo) e o art. 107, da Constituição do Estado de Santa Catarina. “A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Público. O princípio da proporcionalidade, nesse contexto, acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais” (STF – ADI n. 2551 MC-QO/MG, Rel. Ministro Celso de Mello). Por isso, não é proporcional nem razoável a lei que, a pretexto de garantir maior segurança, proíbe o consumo de bebidas alcoólicas em logradouros públicos, mas restringe o direito de liberdade individual, sobretudo porque a ingestão moderada de bebida alcoólica, além de ser legalmente lícita, é socialmente aceita e tolerada e, além disso, o consumo excessivo é reprimido por dispositivos legais mais eficazes. (TJSC, Direta de Inconstitucionalidade n. 8000075-98.2016.8.24.0000, de Canoinhas, rel. Des. Jaime Ramos, j. 15-02-2017).

Juristas
Juristashttp://juristas.com.br
O Portal Juristas nasceu com o objetivo de integrar uma comunidade jurídica onde os internautas possam compartilhar suas informações, ideias e delegar cada vez mais seu aprendizado em nosso Portal.

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

TJSP confirma indenização de R$ 120 mil a esposa de homem atropelado por ônibus

A 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou, com ajustes, a sentença da 2ª Vara Judicial de Miracatu que condenou uma empresa de transporte coletivo e, de forma subsidiária, o Município, ao pagamento de indenização por danos morais à esposa de um pedestre atropelado. A reparação foi majorada para R$ 120 mil.

TJSP mantém condenação de franqueadora por violar exclusividade territorial e determina indenização a franqueados

A 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou, em parte, a sentença que condenou uma empresa do setor odontológico por descumprimento contratual no sistema de franquias. A franqueadora deverá restituir integralmente o valor investido pelos franqueados, além de pagar indenização por danos morais no montante de R$ 30 mil. Também foi mantida a rescisão do contrato.

Homem é condenado a 3 anos e 6 meses de prisão por injúria racial contra porteiro em Santo André

A 3ª Vara Criminal de Santo André condenou um homem à pena de três anos e seis meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do crime de injúria racial contra um porteiro de condomínio.

Estado de São Paulo é condenado a indenizar aluno vítima de discriminação racial por professor

A 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou, com ajustes, sentença da 2ª Vara da Fazenda Pública de Guarulhos que condenou o Estado de São Paulo ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil a aluno da rede pública estadual vítima de discriminação racial praticada por professor em sala de aula.