Aplicada justa causa provocada por declarações discriminatórias

Data:

Cilindo de Oxigênio
Créditos: Kesu01 / iStock

Declarações que possam ser entendidas como discriminatórias, mesmo que inseridas em um contexto de opinião política, podem ensejar dispensa por justa causa. Esse foi o entendimento da Décima Sétima Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-SP), ao reformar sentença que havia declarado nula a rescisão motivada de supervisora de uma empresa de telemarketing.

A trabalhadora foi demitida depois de denúncias realizadas por colegas de trabalho sobre declarações que questionariam a autonomia e a credibilidade da raça indígena, além de inferiorizar homossexuais, negros e nordestinos. Em primeira instância, conseguiu reverter a dispensa para imotivada (sem justa causa) sob a alegação de que não havia ofensas em suas declarações, somente opiniões de natureza política sobre determinados grupos sociais.

Ao julgar o recurso, o juiz convocado Rodrigo Garcia Schwarz, redator designado do acórdão, destacou que “as manifestações da reclamante em serviço, robustamente comprovadas, ultrapassam o limite razoável da mera opinião de natureza política, sendo injuriosas e incompatíveis com o padrão de civilidade exigível no ambiente do trabalho”.

De acordo com Schwarz, a própria empresa poderia ser responsabilizada por não coibir tais comentários, já que responde de forma objetiva pelos atos dos que trabalham para ela. “Ao tolerar tais manifestações, a companhia poderia ter o seu nome e a sua imagem associada a esses sentimentos discriminatórios”, destacou.

O voto da relatora do acórdão, em sentido contrário, foi vencido.

Ainda cabe recurso.

Processo: 1000576-35.2019.5.02.0064 - Acórdão (inteiro teor para download)

(Com informações do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região - TRT-SP)

EMENTA

DISPENSA POR JUSTA CAUSA. MANIFESTAÇÕES DISCRIMINATÓRIAS, RACISTAS E HOMOFÓBICAS NO AMBIENTE DE TRABALHO. MAU PROCEDIMENTO CONFIGURADO. DISPENSA DISCIPLINAR TEMPESTIVA, PROPORCIONAL E PEDAGÓGICA.

Embora seja livre, nos termos do art. 5º, IV, da Constituição da República, a manifestação do pensamento, tal liberdade não é absoluta, não resguardando manifestações francamente discriminatórias, racistas e homofóbicas, que ultrapassam o limite razoável da mera opinião de natureza política, sendo injuriosas e incompatíveis com o padrão de civilidade exigível no ambiente do trabalho, o que se agrava pela posição de superioridade hierárquica ostentada pela trabalhadora (supervisora), que exige do empregado maior responsabilidade quanto aos seus próprios atos perante terceiros. Mau procedimento é o contrário ao bom e correto procedimento, e isso se refere à prática de atos que consubstanciem atitudes desrespeitosas, inadequadas ou irregulares, inclusive sob o ponto de vista ético. Manifestações discriminatórias, racistas e homofóbicas no ambiente de trabalho não podem ser toleradas, ainda que artificialmente ancoradas no expediente da "opinião política" ou da "liberdade de expressão", porque a trabalhadora não trata, no caso, apenas de política, mas de expressar sentimentos que, para além da política, se evidenciam francamente discriminatórios, racistas e homofóbicos, que na prática consubstanciam discurso que deprecia e desqualifica pessoas em razão de fatores como cor, etnia, orientação sexual ou procedência nacional, e que tendem a atingir moralmente terceiros que com ela trabalham - ninguém é proibido de tê-los, no seu íntimo, mas expressá-los publicamente, em particular no ambiente de trabalho e em condição hierárquica diferenciada, consubstancia atentado à ordem jurídica, ao dever de urbanidade no convívio social e à fidúcia depositada pelo empregador (mau procedimento, portanto). Suficientemente graves as manifestações discriminatórias, racistas e homofóbicas da reclamante em serviço, ponderável a providência da empresa em despedir a supervisora por mau procedimento após a apuração das várias denúncias recebidas, evidenciando-se tempestiva, proporcional e pedagógica a dispensa disciplinar.

(TRT-SP - PROCESSO TRT/SP Nº 1000576-35.2019.5.02.0064 PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO - PJE RECURSO ORDINÁRIO - 64 ª VT DE SÃO PAULO RECORRENTE: TELEPERFORMANCE CRM S.A. RECORRIDA: DEBORA RUBIA GALAMBOS TORQUATO REDATOR DESIGNADO: RODRIGO GARCIA SCHWARZ. Data de Publicação 16/12/2019)

Juristas
Juristashttp://juristas.com.br
O Portal Juristas nasceu com o objetivo de integrar uma comunidade jurídica onde os internautas possam compartilhar suas informações, ideias e delegar cada vez mais seu aprendizado em nosso Portal.

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Empresa condenada por uso indevido de marca registrada

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que uma empresa cessasse a venda de roupas que utilizavam indevidamente uma marca registrada por outra empresa do mesmo segmento.

Modelo de contrato de prestação de serviços de Personal Trainer para Triatetlas

O presente contrato tem por objeto a prestação de serviços de personal trainer especializado em treinamento para triatletas, com o objetivo de melhorar o desempenho do Contratante nas modalidades de natação, ciclismo e corrida.

Empresa de fotos e vídeos condenada por falha em filmagem de casamento

A 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirmou a decisão da Comarca de Lavras que responsabilizou uma empresa de fotografia e vídeo a pagar R$ 10 mil por danos morais e R$ 1,4 mil por danos materiais a uma noiva, devido a falhas na filmagem de seu casamento.

Homem trans será indenizado por não ter nome social reconhecido em registro bancário

A 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) alterou uma decisão inicial e determinou que um banco indenize um homem trans em R$ 10 mil por danos morais devido ao não reconhecimento do seu nome social nos registros bancários.