A suspensão e a concentração das execuções fiscais da união, estados e municípios em caso de recuperação judicial e a adpf 357

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A suspensão e a concentração das execuções fiscais da união, estados e municípios em caso de recuperação judicial e a adpf 357 | Juristas1. Introdução

O julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 357 (2) impôs profunda alteração na disciplina jurídica da cobrança executiva de créditos tributários da União, estados e municípios, cujas consequências alcançam inclusive as relações entre a disciplina da execução fiscal e a da recuperação judicial da empresa devedora.

Para compreender os impactos da ADPF 357 no sistema recuperacional, primeiro descreverei a ratio decidendi deste precedente fundamental no sistema da cobrança executiva do crédito tributário. Após, explorarei as consequências hermenêuticas deste precedente no sistema da cobrança executiva do crédito tributário contra empresa em recuperação judicial.

2. A ratio decidendi da ADPF 357

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental é a ação regida pelo art. 102, § 1º, da Constituição e pela Lei 9.882/1999 pela qual realiza-se o controle concentrado da constitucionalidade de lei ou atos normativos, inclusive os anteriores à promulgação da Constituição de 1988, com base nos preceitos fundamentais da Constituição, entendidos como os princípios e normas essenciais do ordenamento jurídico brasileiro incrustrados implícita ou explicitamente na Constituição.

Ao julgar a ADPF 357, o Tribunal Pleno do STF declarou a inconstitucionalidade das normas contidas no parágrafo único do art. 187 do CTN (3) e no parágrafo único do art. 29 da Lei n. 6.830/1980(4) (Lei de Execuções Fiscais), que previam, na cobrança do crédito tributário, um concurso de preferências no qual a União preferia aos estados e estes, aos municípios; bem como cancelou a Súmula 563 do STF. (5) A ADPF 357 levou a que o STJ cancelasse posteriormente a Súmula 497 do STJ. (6)

O fundamento central do precedente reside em que referidas preferências creditórias afrontavam o princípio federativo, expressamente previsto no art. 19, III, da Constituição, de seguinte redação: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: III – criar […] preferências entre si.”

Conforme observou o Min. Luiz Fux em seu percuciente voto,(7) a ADPF 357 constitui precedente, nos termos do art. 927 do Código de Processo Civil, que contém “um verdadeiro overruling, uma mudança completa de jurisprudência, uma viragem jurisprudencial, exatamente uma das grandes preocupações do Código de Processo Civil,” o qual assenta em “fundamento não só de direito constitucional, mas também de direito processual, que prevê o overruling exatamente quando se está diante de um novo ambiente objetivo e jurídico”.

O Tribunal Pleno decidiu nos termos do voto da relatora Min. Cármen Lúcia, acompanhado pelos votos dos Ministros Ricardo Lewandowski, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Marco Aurélio e o Luiz Fux. Foram vencidos o Min. Gilmar Mendes, que julgava parcialmente procedente a ação, para dar interpretação conforme a Constituição, e o Min. Dias Toffoli, que julgava improcedente a ação.

Com efeito, o precedente firmado pela ADPF 357 constitui verdadeira norma jurídica que deve ser observada na interpretação judicial de casos envolvendo a cobrança executiva de crédito tributário, conforme o disposto no art. 927, I, do Código de Processo Civil, segundo o qual os “juízes e os tribunais observarão […] as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade”.

O fundamento central da decisão, sublinhado no voto da relatora e nos demais votos que o acompanharam, assenta na imposição constitucional do tratamento isonômico entre os entes federados na ordem constitucional de 1988, a qual impede que lei estabeleça preferências na ordem de pagamento de créditos detidos por diferentes entes federativos.

Conforme consignou a relatora Min. Cármen Lúcia em seu voto vencedor,(8) a validade da adoção de um “critério diferenciador para definição da ordem de pagamento de créditos” de entes federados, depende da observância de dois critérios: (i) em primeiro lugar, a preferência deve ser prevista em norma constitucional, “não em norma infraconstitucional”, pois, “estabelecendo a Constituição da República a federação como forma de Estado, estatuindo a autonomia dos entes federados como núcleo da forma estatal (art. 18), somente pelo desenho constitucional se poderia estatuir preferências entre os entes para efeito de pagamento dos créditos tributários; e (ii) em segundo lugar, “o que legitima critério de diferenciação – prevalecente o princípio da igualdade dos entes federados e da autonomia de cada qual – é a finalidade constitucional adequadamente demonstrada. No caso, nem a diferenciação põe-se em norma constitucional nem se comprova finalidade constitucional legítima buscada com a distinção estabelecida nas normas questionadas.”(9)

Conforme concluiu a Min. Cármen Lúcia, inexiste “no texto constitucional de 1988 fundamento válido para acolher no ordenamento jurídico brasileiro norma infraconstitucional que crie distinções entre os entes federados na cobrança judicial dos créditos tributários e não tributários, tenho como procedente o pedido apresentado na presente arguição de descumprimento de preceito fundamental.”(10)

A vedação à criação de preferências na cobrança dos créditos dos diferentes entes federados no sistema constitucional de 1988 foi profundamente explorada nos votos que acompanharam o voto da Relatora, os quais contém elementos essenciais do precedente.

No seu minucioso voto, o Min. Nunes Marques(11) observou que a ordem de preferências creditórias prevista nos arts. 187, parágrafo único, do CTN e no art. 29, parágrafo único, da Lei 6.830/1980, “rompe não apenas com a igualdade entre as diferentes esferas federadas mas também com a consequente autonomia dos entes subnacionais, na medida em que tolhe a capacidade de Estados e Municípios satisfazerem seus créditos quando em concorrência com a União.” Por isso, em seu voto, sublinhou o entendimento doutrinário de Luíz Eduardo Schoueri, segundo o qual, no sistema constitucional de 1988, “mais adequado será assegurar a todas as Fazendas Públicas igualdade, repartindo-se o produto da execução entre elas, proporcionalmente ao crédito de cada uma”(12) e transcreveu a lição de Eduardo Bottallo, segundo a qual “o princípio da federação, tal como contemplado pela Constituição de 1988, não abriga a subsistência da discriminação em causa. É sobremodo fluente a dúvida quanto ao fato do parágrafo único do artigo 187, do CTN, haver sido recepcionado pela Constituição de 1988.”(13)

Com efeito, conforme pontificou o Min. Nunes Marques, caso prevalecesse:

“o entendimento quanto à constitucionalidade dos preceitos contidos no art. 187, parágrafo único, do Código Tributário Nacional e no art. 29, parágrafo único, da Lei de Execuções Fiscais, correríamos o risco de abrir margem para que a União, valendo-se da preferência de seus créditos para satisfazer suas cobranças, viesse a perseguir bens eventualmente garantidores de execuções já ajuizadas pelos demais entes federados. Ou seja, nota-se potencial de frustração na cobrança de créditos estaduais e municipais, a prejudicar o próprio pacto federativo e a consequente autonomia dos entes, que estariam impossibilitados de dar prosseguimento às próprias execuções. De nada adiantaria, portanto, a Constituição atribuir competências tributárias próprias se, no momento de buscar a satisfação em juízo, os entes subnacionais tivessem de aguardar eventual adimplemento de crédito da União.”(14)

Com efeito, este elemento essencial do precedente contém, em um nível acima de generalização, que as normas legais que disciplinam a cobrança do crédito tributário não podem estabelecer que um ente tributário possa dar prosseguimento à sua execução enquanto outros entes tributários ficam impossibilitados de dar prosseguimento às suas execuções.

Coadunando-se com os votos vencedores, o judicioso voto do Min. Alexandre de Moraes cuidou de explicitar outro relevante elemento essencial do precedente, ao consignar que:

“No caso de concurso de credores formado entre os entes políticos, o rateio dos valores obtidos com a excussão do patrimônio do devedor em igualdade de condições permite uma melhor distribuição desta receita e sua aplicação ao desempenho das políticas públicas, em cada esfera de atuação.”(15)

Por conseguinte, rematou o Min. Alexandre de Moraes:

“Diante da situação concreta em que o patrimônio do contribuinte, no curso de uma execução fiscal, mostra-se insuficiente para a satisfação de todos os créditos fiscais, devem as Fazendas Públicas em questão concorrerem em igualdade de condições sobre o patrimônio do devedor, sob pena de se subverter a divisão de competências tributárias e repartição de receitas estabelecidas na Constituição.”(16)

Daí extraem-se os seguintes elementos essenciais do precedente, expressamente debatidos em plenário: nos casos em que o patrimônio do contribuinte “mostra-se insuficiente para a satisfação de todos os créditos fiscais, devem as Fazendas Públicas em questão concorrerem em igualdade de condições sobre o patrimônio do devedor”, e este concurso de credores contra devedor insolvente deve observar regra de “rateio dos valores obtidos com a excussão do patrimônio do devedor em igualdade de condições”.

3. Consequências da ADPF 357 para o sistema da cobrança executiva do crédito tributário

Ao afetar as disposições legais relativas ao concurso de preferência creditórias dos entes federados, a ADPF 357 impõe a necessidade de se reorganizar o sistema da cobrança executiva do crédito tributário, inclusive nas suas relações com os procedimentos concursais de recuperação judicial e falência.

A igualdade de tratamento dos entes federados, credores de um devedor comum e insolvente, pressupõe uma instrumentalização processual adequada, conforme o direito fundamental de ação contido no art. 5º, XXXV, da Constituição. Não há como assegurar-se a igualdade de tratamento entre os entes federados sem a instauração de um procedimento de concurso de credores tributários contra o devedor comum. Por isso, a ADPF 357 constitui uma rachadura no monolito do solipsismo da execução fiscal singular, sintetizado pelas disposições legais que preveem que (i) o crédito tributário não participa de concurso de credores (art. 187, caput, do CTN e art. 29, caput, da Lei 6.830/1980), que (ii) a “competência para processar e julgar a execução da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro Juízo” (art. 5º da Lei 6.830/1980), o que inclui a competência de outro juízo perante o qual esteja a processar-se execução fiscal de outro ente federativo, e que (iii) a concentração de execuções fiscais contra um mesmo devedor, prevista no art. 28 da Lei 6.830/1980, trata-se de faculdade do juiz, que só pode ser determinada se as execuções envolverem as “mesmas partes”,(17) isto é, o mesmo executado e o mesmo ente federado exequente.

Após o julgamento da ADPF 357, a concentração das execuções fiscais contra devedor insolvente em um único juízo é medida que se impõe, sob pena de admitir-se norma processual que conduza à violação da isonomia de tratamento entre entes federados e à violação do pacto federativo. Com efeito, a concentração das execuções fiscais não constitui mais uma faculdade do juízo de execução fiscal, mas medida imperativa que deve ser determinada inclusive de ofício. A concentração das execuções fiscais não depende de provocação deste ou daquele credor tributário. Ademais, as procuradorias das fazendas públicas, enquanto integrantes da Administração Pública, estão adstritas à observância dos preceitos constitucionais, inclusive o do pacto federativo e o do tratamento isonômico entre os créditos dos diferentes entes federados. Portanto, as procuradorias das fazendas devem cooperar entre si para assegurar a estrita observância da igualdade de tratamento de seus créditos, que devem ser satisfeitos pro rata em caso de devedor insolvente.

Para haver concentração de execuções fiscais, cumpre primeiro suspender-se o curso das execuções fiscais individuais. Afinal, em razão da ADPF 357, não se pode permitir que algumas execuções fiscais prossigam individualmente, de modo a obterem uma preferência creditória pela anterioridade em detrimento das demais execuções fiscais e do tratamento igualitário, pro rata, entre os diferentes credores tributários. Bem concretamente, não pode norma infraconstitucional, de que é exemplo o § 7º-B do art. 6º da Lei 11.101/2005, autorizar a continuação individual das execuções manejadas por diferentes entes federados contra devedor insolvente, sob pena de violar os preceitos constitucionais tutelados pelo precedente formado na ADPF 357.

A concentração de execuções em um único juízo pode realizar-se tanto mediante a efetiva redistribuição das execuções fiscais a um único juízo ou pela atribuição a um único juízo da competência para a prática de atos de execução e da subsequente distribuição pro rata do produto da excussão dos bens do devedor aos juízos onde encontram-se as execuções fiscais originárias.

Na arquitetura constitucional brasileira, parece-me que a Justiça Estadual, com sua competência residual, inclusive para causas de falência e recuperação judicial (cf. art. 109, I, da Constituição e o RE 583.955), é a mais bem vocacionada para concentrar as execuções fiscais contra devedor comum insolvente.

A concentração de execuções fiscais é medida que se impõe em caso de o devedor comum pedir recuperação judicial, pois o pedido de recuperação judicial assenta no reconhecimento da incapacidade financeira do devedor de pagar todas as suas obrigações. Trata-se de situação em que inequivocamente se manifesta a insolvência, ainda que transitória, do devedor comum. O pedido de recuperação judicial não somente indica tratar-se de devedor insolvente, mas também facilita a própria operacionalização da concentração das execuções fiscais, pois todas as fazendas públicas são intimadas do deferimento do processamento da recuperação judicial “a fim de que tomem conhecimento da recuperação judicial e informem eventuais créditos perante o devedor, para divulgação aos demais interessados”, conforme prevê o art. 52, V, da Lei 11.101/2005. Idem, com relação à falência, de cuja decretação são intimadas todas as fazendas públicas (art. 99, XIII, da Lei 11.101/2005), que deverão habilitar seus créditos na massa falida.

É em razão da incapacidade de pagamento do devedor comum que se justifica tanto a negociação com os credores na recuperação judicial quanto a negociação de transação ou parcelamento tributários do passivo da empresa em recuperação judicial. Enquanto uma das fazendas públicas negocia transação com a empresa em recuperação judicial, as demais fazendas públicas não podem se recusar a transigir e optar por prosseguir com suas execuções individuais, pois uma tal medida significaria o desrespeito à igualdade de tratamento entre os créditos dos diferentes entes federados. Neste particular, deve-se incentivar e aprofundar a prática de transação fiscal, conforme o eficientíssimo e alvissareiro exemplo fornecido pela Procuradoria da Fazenda Nacional.

A recuperação judicial possui como um de seus desdobramentos naturais a decretação da falência da empresa devedora. O insucesso das negociações com os credores conduz, por diferentes vias, à falência, na qual os credores tributários e não tributários participarão do concurso universal. Consoante relevantíssimo precedente do STJ da segura relatoria do Min. Marco Aurélio Belizze, (18) as hipóteses de convolação da recuperação judicial em falência, por não apresentação de CND ou por pedido das fazendas públicas, têm a finalidade de “dar concretude à preferência legal conferida ao crédito de titularidade da Fazenda Pública”, em julgado que se ocupou de analisar as normas de preferências creditórias das fazendas públicas em relação aos credores não tributários da empresa devedora comum. Isto é, as preferências creditórias verticais das fazendas públicas.

Ao lado desta hipótese, firmada em relevante precedente do STJ, também se deve interpretar as normas que estabelecem a preferência horizontal do crédito tributário em relação aos demais credores tributários da empresa devedora comum, aos quais se deve dispensar tratamento igualitário, pro rata, por força da ADPF 357. A regra de preferência horizontal dos créditos tributários traduz-se no imperativo de tratamento igualitário, pro rata, das fazendas públicas. Este tratamento igualitário é assegurado e operacionalizado em caso de falência do devedor comum e deve ser igualmente assegurar em caso de recuperação judicial do devedor comum.

Conclusão

Ao fim e ao cabo, o precedente firmado por ocasião do julgamento da ADPF 357 autoriza a conclusão segundo a qual o sistema da supremacia do executivo fiscal(19) singular instituído pelo art. 187 do CTN não condiz com a atual ordem constitucional brasileira, pois conduz a graves violações do pacto federativo, que podem ser evitadas pela concentração da atividade executiva em um único juízo, isto é, em um juízo concursal, que cuide de dispensar tratamento igualitário, pro rata, aos diferentes entes federados.

O juízo competente para concentrar as execuções fiscais, parece-me, deve pertencer à Justiça Estadual, por ostentar competência residual para reunir em concurso pretensões de competência originária da Justiça Federal (art. 109, I, da Constituição) e, também, da Justiça do Trabalho (RE 583.955). Neste sentido, quem sabe os futuros rumos a serem trilhados pela jurisprudência venham a reconhecer a vocação natural do juízo recuperacional, enquanto pertencente à Justiça Estadual, para tutelar os interesses dos credores tributários, quanto à sua preferência vertical em relação a outros credores não tributários e quanto ao tratamento horizontal igualitário dos créditos tributários dos diferentes entes federados ante o devedor comum em recuperação judicial.

O certo, porém, é que, consoante a sábia dicção do Min. Luiz Fux, o preceito constitucional do pacto federativo e a sua tutela pela ADPF 357 decorreram de “um novo ambiente objetivo e jurídico”,(20) que reclama da comunidade de intérpretes a adequação do sistema de cobrança executiva do crédito tributário, inclusive contra empresa em recuperação judicial.

Notas:

1 Texto corrigido e alterado em 01.12.2023 às 8:29h. 2 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (“A arguição de descumprimento de preceito fundamental viabiliza a análise de constitucionalidade de normas legais préconstitucionais insuscetíveis de conhecimento em ação direta de inconstitucionalidade. Precedentes. 

2 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (“A arguição de descumprimento de preceito fundamental viabiliza a análise de constitucionalidade de normas legais préconstitucionais insuscetíveis de conhecimento em ação direta de inconstitucionalidade. Precedentes. 2. A autonomia dos entes federados e a isonomia que deve prevalecer entre eles, respeitadas as competências estabelecidas pela Constituição, é fundamento da Federação. O federalismo de cooperação e de equilíbrio posto na Constituição da República de 1988 não legitima distinções entre os entes federados por norma infraconstitucional. 3. A definição de hierarquia na cobrança judicial dos créditos da dívida pública da União aos Estados e Distrito Federal e esses aos Municípios descumpre o princípio federativo e contraria o inc. III do art. 19 da Constituição da República de 1988. 4. Cancelamento da Súmula n. 563 deste Supremo Tribunal editada com base na Emenda Constitucional n. 1/69 à Carta de 1967. 5. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente para declarar não recepcionadas pela Constituição da República de 1988 as normas previstas no parágrafo único do art. 187 da Lei n. 5.172/1966 (Código Tributário Nacional) e no parágrafo único do art. 29 da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais).”). 

3 Lia-se no art. 187, parágrafo único, do CTN: “O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem: I – União; II – Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pró rata; III – Municípios, conjuntamente e pró rata.”  

4 Lia-se no art. 29, parágrafo único, da Lei 6.830/1980: “Parágrafo Único – O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem: I – União e suas autarquias; II – Estados, Distrito Federal e Territórios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata; III – Municípios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata.” 

 5 Lia-se na cancelada Súmula 563 do STF: “O concurso de preferência a que se refere o parágrafo único do art. 187 do Código Tributário Nacional é compatível com o disposto no art. 9º, inciso I, da Constituição Federal.”  

6 Lia-se na Súmula 497 do STJ: “Os créditos das autarquias federais preferem aos créditos da Fazenda estadual desde que coexistam penhoras sobre o mesmo bem.” Súmula cancelada em 14.09.2022. 

 7 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (no voto do Min. Luiz Fux, lê-se: “O que há de interessante neste caso é que essa é uma jurisprudência tão sólida, tão antiga, que foi sedimentada na Súmula 563, que acolhia essa preferência. Agora estamos diante de uma verdadeira superação, um verdadeiro overruling, uma mudança completa de jurisprudência, uma viragem jurisprudencial, exatamente uma das grandes preocupações do Código de Processo Civil. O ponto alto do Código de Processo Civil foi exatamente a adoção do sistema stare decisis, do sistema anglo-saxônico. Mesmo assim, mesmo estabelecendo que a jurisprudência, principalmente a jurisprudência sumular, tem de ser estável, íntegra e coerente, o Código não se eximiu de prever que há um outro tempo que reclama um outro Direito. Depois de estabelecer a teoria do stare decisis no art. 927, o legislador processual fez inserir que a modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada é possível, desde que haja fundamentação adequada específica – que é o que está havendo agora, demonstrado, à saciedade, pela eminente Relatora -, sempre observados os princípios da segurança jurídica, da proteção, da confiança e da isonomia.” […] “Com esse fundamento não só de direito constitucional, mas também de direito processual, que prevê o overruling exatamente quando se está diante de um novo ambiente objetivo e jurídico, é que também acompanho, integralmente, o minucioso voto da eminente Ministra Cármen Lúcia, no sentido de julgar procedente esta ADPF e declarar não recepcionada pela ordem constitucional de 1988 os artigos aqui mencionados do Código Tributário Nacional – art. 187, parágrafo único – e da Lei de Execuções Fiscais – art. 29, parágrafo único, – a fortiori, gerando, com isso, o cancelamento da Súmula 563.”). 

8 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (no voto da Min. Cármen Lúcia, lê-se: “Anoto ser certo poder haver critério diferenciador para definição da ordem de pagamento de créditos, o que é legítimo.” […] “Entretanto, dois pontos precisam ser enfatizados para que se reconheça a validade do critério distintivo: o primeiro, a igualdade modelada constitucionalmente entre as pessoas somente pode ter contornos definidores no sistema constitucional, não em norma infraconstitucional. Quer dizer: estabelecendo a Constituição da República a federação como forma de Estado, estatuindo a autonomia dos entes federados como núcleo da forma estatal (art. 18), somente pelo desenho constitucional se poderia estatuir preferências entre os entes para efeito de pagamento dos créditos tributários. Segundo, o que legitima critério de diferenciação – prevalecente o princípio da igualdade dos entes federados e da autonomia de cada qual – é a finalidade constitucional adequadamente demonstrada. No caso, nem a diferenciação põe-se em norma constitucional nem se comprova finalidade constitucional legítima buscada com a distinção estabelecida nas normas questionadas.” […] “Não verificando no texto constitucional de 1988 fundamento válido para acolher no ordenamento jurídico brasileiro norma infraconstitucional que crie distinções entre os entes federados na cobrança judicial dos créditos tributários e não tributários, tenho como procedente o pedido apresentado na presente arguição de descumprimento de preceito fundamental.”).  

9 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (voto da Min. Cármen Lúcia).  

10 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (voto da Min. Cármen Lúcia).  

11 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (no voto do Min. Nunes Marques, lê-se que “a normativa em questão – que são leis editadas pela União –, ao diferenciar os créditos dos entes públicos, de modo a atribuir ordem de prioridade, rompe não apenas com a igualdade entre as diferentes esferas federadas mas também com a consequente autonomia dos entes subnacionais, na medida em que tolhe a capacidade de Estados e Municípios satisfazerem seus créditos quando em concorrência com a União.”). 

12 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (destaca-se o seguinte trecho citado no voto do Min. Nunes Marques foi: “Parece questionável, na Constituição de 1988, a existência da ordem proposta pelo Código Tributário Nacional. Afinal, nada há na Constituição que assegure a preferência do crédito de uma Pessoa Jurídica de Direito Público sobre outra; mais adequado será assegurar a todas as Fazendas Públicas igualdade, repartindo-se o produto da execução entre elas, proporcionalmente ao crédito de cada uma.” SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 907). 

13 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (trecho transcrito no voto do Min. Nunes Marques do artigo BOTTALLO, Eduardo D. Reflexões sobre o processo de execução fiscal na Constituição de 1988. RDT 66/138).  

14 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (trecho do voto do Min. Nunes Marques). 

15 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (trecho do voto do Min. Alexandre de Moraes).  

16 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (trecho do voto do Min. Alexandre de Moraes). 

17 SCHERER, Tiago. Lei de execuções fiscais comentada e interpretada. São Paulo: Quartier Latin, 2022, p. 485. 

18 STJ, REsp 2.053.240, Terceira Turma, j. 17.10.2023, v.u., rel. Min. Marco Aurélio Belizze. 

19 Tomei a expressão de BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense. 1993, p. 607.  

20 STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (no voto do Min. Luiz Fux, lê-se: “O que há de interessante neste caso é que essa é uma jurisprudência tão sólida, tão antiga, que foi sedimentada na Súmula 563, que acolhia essa preferência. Agora estamos diante de uma verdadeira superação, um verdadeiro overruling, uma mudança completa de jurisprudência, uma viragem jurisprudencial, exatamente uma das grandes preocupações do Código de Processo Civil. O ponto alto do Código de Processo Civil foi exatamente a adoção do sistema stare decisis, do sistema anglo-saxônico. Mesmo assim, mesmo estabelecendo que a jurisprudência, principalmente a jurisprudência sumular, tem de ser estável, íntegra e coerente, o Código não se eximiu de prever que há um outro tempo que reclama um outro Direito. Depois de estabelecer a teoria do stare decisis no art. 927, o legislador processual fez inserir que a modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada é possível, desde que haja fundamentação adequada específica – que é o que está havendo agora, demonstrado, à saciedade, pela eminente Relatora -, sempre observados os princípios da segurança jurídica, da proteção, da confiança e da isonomia.” […] “Com esse fundamento não só de direito constitucional, mas também de direito processual, que prevê o overruling exatamente quando se está diante de um novo ambiente objetivo e jurídico, é que também acompanho, integralmente, o minucioso voto da eminente Ministra Cármen Lúcia, no sentido de julgar procedente esta ADPF e declarar não recepcionada pela ordem constitucional de 1988 os artigos aqui mencionados do Código Tributário Nacional – art. 187, parágrafo único – e da Lei de Execuções Fiscais – art. 29, parágrafo único, – a fortiori, gerando, com isso, o cancelamento da Súmula 563.”).


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