Projeto de Lei Complementar que altera a base de cálculo para o IPTU e ITBI pode causar rombo nos cofres municipais

Data:

Projeto de Lei Complementar que altera a base de cálculo para o IPTU e ITBI pode causar rombo nos cofres municipais | Juristas
Marco Aurélio Ferreira, advogado e sócio da Martinho & Alves Advogados nas áreas de Direito Tributário e Agronegócios.

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar (PLP) 85/23, que busca alterar o Código Tributário Nacional para que a base de cálculo do IPTU e do ITBI seja o valor de mercado, no lugar do valor venal dos bens imóveis sobre os quais incide a tributação, a exemplo do que ocorre para a cobrança de imposto sobre a propriedade de veículos automotores.

Antes de adentrar na referida proposta, é bom entender que, de acordo com a atual dicção do Código Tributário Nacional, o IPTU tem como fato gerador a propriedade de imóvel e sua base de cálculo é o valor venal, assim entendido a avaliação considerada pela legislação tributária local (no caso, os Municípios) que leva em conta a localização, o tempo de uso, desconsiderando melhorias individuais dos referidos imóveis.

O ITBI, por sua vez, tem como fato gerador a transmissão de bens imóveis ou de direitos a eles relativos, tais como venda, cessão, constituição de direitos reais, como usufruto, por exemplo.

Pois bem! Visto como funciona, cabe agora analisar o que o referido projeto de lei complementar sugere.

A análise das alterações propostas indica que o objetivo do referido projeto é a redução disfarçada do tributo, mas, da forma apresentada, além de parecer inviável, pode gerar o efeito oposto de aumentar o valor do tributo.

Ao compararmos a redação original e a proposta de alteração nos artigos 33 e 38, que tratam do IPTU e do ITBI, respectivamente, temos as seguintes considerações:

· Houve alteração da base de cálculo de valor venal para valor de mercado;

· Incluída a previsão de que o valor encontrado pela aplicação da alíquota sobre a base de cálculo é o valor máximo do tributo, dando a entender que pode ser menor;

· Mantida a proibição de inclusão, na base de cálculo, de melhorias no imóvel;

· Incluída a proibição de aumento da base de cálculo de forma genérica – prática essa já vedada pelos tribunais;

· Previsão da possibilidade de utilização de dados dos registros de imóveis ou do valor venal como base de cálculo de forma a agilizar a avaliação pelo ente público, sendo que, dessa forma, a base de cálculo seria reduzida para 75% sobre o valor do bem.

Com a devida vênia, entendemos que a referida proposta de lei, caso aprovada, seria inexequível e até mesmo contraproducente.

A fixação da base de cálculo de imóveis é assunto complexo, sendo de ordem que cada Município, anualmente, apresente uma Planta Genérica de Valores, que é o instrumento definido por lei municipal que, utilizando critérios como localização, destinação e padrão de construção, estabelece o valor do metro quadrado dos imóveis e estipula seu valor venal, permitindo a tributação pelo IPTU.

Pela proposta, seria mantido o trâmite legislativo e acrescentaria a burocracia necessária para se analisar, individualmente, os imóveis, pois somente assim seria possível auferir o valor de mercado.

Num primeiro momento, é sabido que, ao se comparar o valor de mercado com o valor venal, é mais comum o valor de mercado ser superior ao valor venal, pois a Planta Genérica de Valores utiliza, dentre outras fontes, os valores médios de transações imobiliárias fornecidos pelos Cartórios de Registro de Imóveis da localidade que, não raro registram operações por valores inferiores aos reais, pois são os montantes declarados pelas partes das operações e não o efetivamente transacionado. Logo, a alteração poderia acarretar um aumento na carga tributária caso a mudança fosse implementada.

Por outro lado, a realidade não é bem essa.

As já combalidas administrações municipais, carentes de recursos para a execução de suas atividades mais básicas, sequer têm pessoal ou estrutura para promover a avaliação do valor de mercado de cada um dos imóveis. Dessa forma, seriam “obrigadas” a fazer uso da já conhecida legislação municipal que fixa a Planta Genérica de Valores, o que baixaria a base de cálculo para 75%, diminuindo, portanto, a arrecadação dos referidos impostos em 25%.

Em suma, o Projeto de Lei Complementar mencionado só poderá acarretar a perda de arrecadação, em percentual importante, comparando-se a redução de tributo sem indicação da fonte de custeio para a concessão da referida “benesse”.


Você sabia que o Portal Juristas está no FacebookTwitterInstagramTelegramWhatsAppGoogle News e Linkedin? Siga-nos!

Marco Aurelio Ferreira
Marco Aurelio Ferreira
Advogado especializado em Direito Tributário e Agronegócios da Martinho&Alves Advogados

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Concessionária de energia é condenada a indenizar usuária por interrupção no fornecimento

A 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação de uma concessionária de energia ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais a uma usuária que ficou sem fornecimento de energia elétrica por quatro dias, após fortes chuvas na capital paulista em 2023. A decisão foi proferida pelo juiz Otávio Augusto de Oliveira Franco, da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Vila Prudente.

Homem é condenado por incêndio que causou a morte do pai idoso

A 3ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a condenação de um homem pelo crime de incêndio que resultou na morte de seu pai idoso. A decisão, proferida pela Vara Única de Conchal, reduziu a pena para oito anos de reclusão, a ser cumprida em regime fechado.

Remuneração por combate a incêndio no Porto de Santos deve se limitar ao valor do bem salvo

A 9ª Vara Cível de Santos condenou uma empresa a pagar R$ 2,8 milhões a outra companhia pelos serviços de assistência prestados no combate a um incêndio em terminal localizado no Porto de Santos. O valor foi determinado com base no limite do bem efetivamente salvo durante a operação.

Casal é condenado por expor adolescente a perigo e mantê-lo em cárcere privado após cerimônia com chá de ayahuasca

A 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a condenação de um casal pelos crimes de sequestro, cárcere privado e exposição ao perigo à saúde ou vida, cometidos contra um adolescente de 16 anos. A decisão, proferida pela juíza Naira Blanco Machado, da 4ª Vara Criminal de São José dos Campos, fixou as penas em dois anos e quatro meses de reclusão e três meses de detenção, substituídas por prestação de serviços à comunidade e pagamento de um salário mínimo.