A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) destacou que o banco emissor do boleto pela venda fraudulenta realizada por uma loja virtual que não entregou ao consumidor os produtos adquiridos não possui responsabilidade. Por unanimidade, os ministros concluíram que não houve falha na prestação do serviço bancário, tendo em vista que a instituição bancária apenas emitiu a guia de pagamento.
O cliente afirmou que adquiriu um refrigerador e uma adega por cerca de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pagando por meio de boleto bancário. Depois da realização do pagamento, ele recebeu da loja virtual a informação de que os produtos seriam entregues no prazo máximo de 15 (quinze) dias, no entanto, os itens nunca chegaram.
Em primeira instância, o juiz de direito condenou a empresa responsável pela loja virtual e o Banco Bradesco ao pagamento dos prejuízos materiais, além de indenização a título de danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais).
No entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afastou a responsabilidade da instituição bancária por entender que somente aos vendedores poderia ser imputada a falha na operação, já que o banco apenas serviu como receptor do valor do boleto bancário emitido.
Por meio de recurso especial, a parte autora alegou que o banco falhou em sua prestação de serviço ao não conferir adequadamente a situação da empresa que receberia os pagamentos.
Suposto estelionato
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no Superior Tribunal de Justiça, destacou que, com o surgimento de novas formas de relacionamento entre clientes e bancos, em especial por meio de sistemas eletrônicos e por meio da rede mundial de computadores, ampliou-se a compreensão jurídica sobre os riscos inerentes às atividades bancárias. Desta forma, afirmou a ministra, a Segunda Seção do STJ firmou entendimento de que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraude e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias (Súmula 479).
Como fruto dessa orientação jurisprudencial, Nancy Andrighi afirmou que as instituições bancárias são consideradas responsáveis em hipóteses como assaltos no interior das agências, inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, desvio de recursos em conta-corrente e clonagem ou falsificação de cartões magnéticos.
Entratanto, na hipótese dos autos, a relatora afirmou que o cliente foi vítima de suposto estelionato, já que adquiriu bens que nunca chegou a receber – nem receberia se fosse utilizado outro meio de pagamento. Ou seja, para a ministra Nancy Andrigui, o banco não pode ser classificado como fornecedor na relação de consumo que causou prejuízos ao cliente, pois não houve falha na prestação de seu serviço.
De acordo a ministra, se as instituições financeiras fossem consideradas pertencentes à cadeia de fornecimento em qualquer hipótese de venda fraudulenta pela internet, “todos os bancos operando no território nacional, incluindo operadoras de cartão de crédito, seriam solidariamente responsáveis pelos vícios, falhas e acidentes de produtos e serviços que fossem adquiridos utilizando-se um meio de pagamento disponibilizado por essas empresas, o que definitivamente não encontra guarida na legislação de defesa do consumidor”.
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS. FRAUDE. COMPRA ON-LINE. PRODUTO NUNCA ENTREGUE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SERVIÇOS BANCÁRIOS. INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA ENTRE PARTICULARES. COMPRA E VENDA ON-LINE. PARTICIPAÇÃO. AUSÊNCIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO.
1.Ação ajuizada em 30/06/2015. Recurso especial interposto em 16/03/2018 e atribuído em 22/10/2018.
2.O propósito recursal consiste em determinar se o banco recorrido seria objetivamente responsável pelos danos suportados pelo recorrente, originados após ter sido vítima de suposto estelionato, perpetrado na internet, em que o recorrente adquiriu um bem que nunca recebeu.
3.Nos termos da Súmula 479/STJ, “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.
4.O banco recorrido não pode ser considerado um fornecedor da relação de consumo que causou prejuízos à recorrente, pois não se verifica qualquer falha na prestação de seu serviço bancário, apenas por ter emitido o boleto utilizado para pagamento.
5.Não pertencendo à cadeia de fornecimento em questão, não há como responsabilizar o banco recorrido pelos produtos não recebidos.
Ademais, também não se pode considerar esse suposto estelionato como uma falha no dever de segurança dos serviços bancários prestados pelo recorrido.
6.Recurso especial não provido.
(STJ – REsp 1786157/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 05/09/2019)