Intercambista teve que retornar ao Brasil por ter ido ao Canadá e ficou sem hospedagem e curso
Por unanimidade, a 37ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve inalterada sentença que fixou uma indenização a intercambista Fabiana Cunha Martins que não conseguiu realizar intercâmbio no Canadá em desfavor de uma agência de turismo.
A agência de turismo, portanto, terá que devolver a quantia paga referente ao pacote de estudos, passagem aérea, bem como como pagar uma indenização a título de danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais).
Conforme o que consta nos autos processuais, a recorrente adquiriu, no ano de 2018, um pacote de intercâmbio no Canadá durante todo o mês de janeiro de 2019, pelo qual realizou o pagamento de R$ 7.000,00 (sete mil reais), fora passagem aérea.
O curso teve início em 7 de janeiro de 2019, no entanto, a cliente foi de forma reiterada informada de que estava inadimplente, tanto em relação ao curso quanto nas despesas de hospedagem e alimentação.
Como ato contínuo, alega, ainda, ter sido impedida de ir para as aulas e de frequentar passeios pelos quais pagou. A instituição de ensino no Canadá confirmou o pagamento tão somentee no dia 14 de janeiro de 2010, no entanto, nesta autora a recorrente já havia organizado seu retorno antecipado ao Brasil.
De acordo com o relator do recurso de apelação, desembargador Sergio Gomes, “a falha na prestação dos serviços por parte da apelante é evidente, não lhe favorecendo a tese de culpa de terceiros, tendo em vista a solidariedade de todos os integrantes da cadeia de prestação do serviço defeituoso, na forma do artigo 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor”, escreveu.
“Não se pode, por fim, responsabilizar a apelada por ter antecipado seu retorno ao Brasil, já que se encontrava absolutamente desamparada no exterior, sem a expectativa de que a situação se resolvesse em tempo hábil. O curso, dado o transcurso do tempo, já estava perdido”, concluiu o relator Sergio Gomes.
Os desembargadores Pedro Kodama e José Tarciso Beraldo completaram a turma julgadora.
Apelação nº 1013741-78.2019.8.26.0114 (Acórdão – inteiro teor para download)
Sentença (inteiro teor para download)
(Com informações do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP)
Ementa:
APELAÇÃO – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – CONSUMIDOR – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA EM PARTE. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
–Curso de contratado pela autora, com destino ao Canadá
–Consumidora que, somente no destino, foi informada pela instituição de ensino de que nenhum pagamento teria sido recebido
–Autora que efetuou o pagamento integral à ré pelo curso, hospedagem e alimentação, que restaram sob ameaça pelo período em que esteve no exterior
–Situação não resolvida em tempo hábil pela ré e demais integrantes da cadeia de prestação do serviço defeituoso, que devem responder pelos danos causados aos consumidores
–Indenização por danos morais não impugnada a contento
-Indenização por danos morais bem fixada em sete mil reais.
SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO.
(TJSP; Apelação Cível 1013741-78.2019.8.26.0114; Relator (a): Sergio Gomes; Órgão Julgador: 37ª Câmara de Direito Privado; Foro de Campinas – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 08/01/2020; Data de Registro: 08/01/2020)
Teor do ato:
Vistos. Fabiana Cunha Martins ajuizou ação de ação de indenização por danos morais e materiais em face de Cennection Line Viagens e Turismo Ltda, ambos qualificadas nos autos, em razão de descumprimento de “Contrato de Agenciamento de Intercâmbio para o Exterior”, por meio do qual a requerida se obrigou a intermediar o intercâmbio em Toronto/Canadá, a ser realizado pela requerente, no período de 01.01.2019 até 03.02.2019. Aduz a autora que após dois dias do início das aulas da escola de idiomas indicada no contrato, foi informada de que a requerida não havia repassado à WTC – Western Town College os valores estabelecidos, tanto para participação no curso, como para a hospedagem e alimentação, de modo a apontar que a autora estaria inadimplente com a instituição de ensino, não podendo, assim, participar das aulas e usufruir das acomodações, o que teria acarretado grande constrangimento à autora, que não teve atendidas suas várias solicitações com vistas à solução da questão. Pede a restituição do valor pago pelo serviço contratado no valor de R$ 11.521,49 e indenização por danos morais no valor de R$ 29.640,00. Em contestação (fls. 59/72), a requerida informa que realizou o pagamento do curso prestado a autora por meio de transferência eletrônica em 19/12/18, em tempo razoável à sua confirmação pela instituição de ensino, eis que antes do início das aulas, previsto para 07/1/2019. Aduz que a instituição de ensino permaneceu em silêncio quando do início das aula permitindo o ingresso da aluna normalmente, sem qualquer ressalva. Aduz que prestou o devido atendimento à autora desde 03/10/2018 até o efetivo embarque para o Canadá (31/12/2019) e até mesmo durante sua estadia em solo estrangeiro. Que mesmo efetuando o pagamento, devido a dificuldade de sua confirmação perante a instituição de ensino, e em razão das ameaças da instituição de ensino contra a aluna, a requerida efetuou novos pagamentos em 11/01/2019 (sexta -feira) o que foi confirmado por envio de e-mail no dia 13/01, no domingo, quando a agência de intercâmbio estava fechada, sendo que no dia 14/01/2019 (segunda feira) a requerida conseguiu a informação do pagamento, quando foi informado que a autora já havia decidido voltar para o Brasil, precipitando-se. Aduz que cumpriu adequadamente o contrato, sendo infundada a pretensão da autora. Houve Réplica em fls. 121/133. É, em suma, o relatório. Fundamento e Decido. Considerando que o magistrado é o destinatário da prova, compete a ele mensurar a pertinência e necessidade na sua produção, deferindo aquelas aptas a sanarem dúvidas pertinentes ao deslinde do feito e indeferindo aquelas sem relevância ao seu convencimento, respeitados, dessa forma, os princípios constitucionais do devido processo legal e da duração razoável do processo. No caso em tela, reputo que os autos estão suficientemente instruídos, tornando desnecessária a produção de outras provas, motivo pelo qual passo ao julgamento antecipado da lide, no termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Não há dúvidas de que estamos diante de uma relação de consumo, figurando a parte requerida como fornecedora, consoante definição contida no artigo 3o, caput, e a parte autora como consumidora, conforme disposto no artigo 2o da Lei no. 8.078/90. Dessa forma, além das regulares disposições civis e constitucionais pertinentes ao direito das obrigações e da responsabilidade civil, aplica-se ao caso sob julgamento o sistema protetivo do Código de Defesa do Consumidor. Feita essa introdução, necessária ao esclarecimento do direito aplicado, passo a análise do caso concreto. A autora contratou os serviços da requerida com objetivo de realizar intercâmbio cultural, tendo como destino Montreal, no Canadá, onde realizaria curso de inglês, no período de 01.01.2019 a 03.02.2019. Para tanto pagou a requerida a quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais), nesse valor contemplados os custos com matrícula, curso de inglês, passeio, acomodação e refeições. O pagamento efetuou-se em 10.05.2018 (fls. 42). Cumpre salientar que a requerida, enquanto agência de viagens e intermediadora, cumpriria o dever de gerir pagamentos, encaminhar documentos e providenciar todo o necessário no país estrangeiro para que a autora/consumidora usufruísse plenamente, com segurança, dos serviços contratados. Essa é atividade essencial das agências de viagens e operadores de intercâmbio, e para isso são contratadas. No caso dos autos, evidentemente a requerida deixou de cumprir suas obrigações contratuais, violando a confiança nela depositada pela autora. Com efeito, a autora, embora tenha efetuado o pagamento à requerida com meses de antecedência, veio a ser comunicada pela “Western Town College”, na data de 09.01.2019, que não lhe foram repassados os valores do curso de inglês, passeio, acomodação e alimentação. Nesse mesmo dia, a autora comunicou-se com a preposta da requerida, conforme conversa por aplicativo de mensagens (fls. 114), informando o ocorrido. Confirmando a ausência de informação sobre o pagamento à escola estrangeira, a declaração de fls. 30 emitida por coordenador da Western Town College. Friso que a celeuma era de fácil solução a requerida. A comprovação de um pagamento não é algo complexo. Assim, não se justifica a demora para solucionar o problema, cujo pagamento somente foi confirmado no dia 15.01.2019, quando a autora já tinha antecipado seu retorno ao Brasil. Há que se sopesar que a autora encontrava-se em país estrangeiro, cujo idioma não dominava, tendo de lidar com situações e problemas aos quais não deu causa, em prejuízo do curso que pretendia frequentar, e sofrendo constrangimentos e ameaças de ser desalojada. Saliento que a autora, munida de boa-fé, encaminhou e-mail a requerida, na data de 13.01.2019 (portanto, no quinto dia após a comunicação da falta de pagamento), cobrando uma solução até o dia que se seguiria (fls. 26/27), inclusive informando que caso a situação não fosse resolvida, anteciparia seu retorno ao Brasil. Não era possível exigir que a autora aguardasse indefinidamente a solução do problema, especialmente diante das graves consequências a que estava exposta. Como dito, a comprovação de um pagamento não é algo que demande muito tempo, sendo que a requerida, no exercício de sua atividade comercial, deveria adotar cautelas no sentido de certificar-se antes do início das viagens de seus clientes se as reservas e pagamentos foram confirmados. Assim, rechaça-se a argumentação da requerida no sentido de que a autora agiu precipitadamente. Ela, requerida, que agiu com retardo. Entendo irrelevante ao julgamento o fato da autora enfrentar problemas com ansiedade/depressão, os quais estariam sob acompanhamento psiquiátrico e com sintomas controlados (fls. 135). Ademais, não há nenhuma relação causal entre essa situação pessoal e a ausência de confirmação de pagamento pelo curso, estadia e alimentação. E a responsabilidade por defeito na prestação do serviço é objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Ressalto que a requerida tinha conhecimento das dificuldades relatadas pela autora quanto a adaptação ao país estrangeiro, conforme troca de mensagens (fls. 103 e ss.), o que não é de modo algum incomum, já que o serviço é destinado a pessoas que não falam o idioma e não conhecem a cultura local. Neste diapasão, como obrigação acessória do contrato de agenciamento e intermediação, decorrente da boa-fé objetiva, deveria a requerida agir com absoluta presteza, o que, diga-se, não fez. Conforme leciona Clóvis do Couto e Silva “os deveres secundários comportam tratamento que abranja toda a relação jurídica. Assim, podem ser examinados durante o curso ou o desenvolvimento da relação jurídica, e, em certos casos, posteriormente ao adimplemento da obrigação principal. Consistem em indicações, atos de proteção, como o dever de afastar danos, atos de vigiliância, da guarda de cooperação, de assistência”. Dado o inadimplemento das obrigações da requerida, abriu-se a possibilidade da autora/consumidora rescindir o contrato, nos termos do art. 475 do Código Civil, cuja postura de retornar ao Brasil antecipadamente tinha o condão de evitar danos maiores e incertos, já que o valor era destinado não só ao curso de inglês, mas também a estadia e alimentação. Como consequência, deverá a requerida ressarcir os valores gastos pela autora com o pagamento do curso (fls. 42), passagens aéreas (fls. 43/47) e notificação (fls. 31). Entendo que os fatos descritos também geram danos morais. Como dito, após realizar o pagamento e se preparar para viagem com meses de antecedência, a autora viu-se em solo estrangeiro tendo que resolver problemas causados pela ineficiência dos serviços prestados pela requerida. Tais fatos escapam ao âmbito dos problemas cotidianos, até porque a situação não tem nada de cotidiana, e geram sensações de insegurança, medo e frustração que são fontes de abalos morais. No arbitramento dos danos morais, entendo que o valor postulado é exorbitante e desproporcional a extensão do abalo, sendo que fixo a indenização no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) equivalente ao valor despendido pela autora com o intercâmbio. Isto posto, julgo parcialmente procedente o pedido inicial, ex vi do art. 487, I, do CPC, para o fim de: a) Condenar a requerida a restituir a autora os valores desembolsados para pagamento do curso (fls. 42), passagens aéreas (fls. 43/47) e notificação (fls. 31), com correção monetária a partir do desembolso e juros de mora a partir da citação; b) Condenar a requerida ao pagamento da danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), com correção monetária a partir do arbitramento e juros de mora a partir da citação. Por força da sucumbência e considerando o teor da Súmula 326 do STJ,condeno o requerido/reconvinte ao pagamento das custas e despesas processuais com correção monetária pelos índices da tabela pratica para cálculo de atualização de débitos judiciais do E. TJSP,a contar dos respectivos desembolsos e juros moratórios de 1% ao mês (artigo 406 CC c.c.161, parágrafo primeiro do CTN), a contar da data do trânsito em julgado deste pronunciamento jurisdicional, quando estará configurada a mora (artigo 407 do CC), bem como honorários advocatícios que arbitro, com fundamento no art. 85, §2º, do CPC, em 10% do valor atualizado da condenação. P.I.C. Advogados(s): Maria Valeria Bueno de Moraes (OAB 141496/SP), Tatiana Veiga Ozaki Bocabella (OAB 213330/SP), Jose Luiz Rocha (OAB 94484/SP)
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