O Segundo Juizado Especial Cível de Brasília condenou a Amil Assistência Médica Internacional S.A. à restituição e ao pagamento de uma indenização a título de danos morais a paciente que foi submetido à cirurgia de emergência para tratamento de câncer e teve negado o reembolso do procedimento pelo plano de saúde.
O autor da demanda judicial contou que recebeu prescrição médica que indicava a necessidade da intervenção cirúrgica para tratamento de câncer de pele. Ao procurar o plano de saúde Amil, não foi apresentada relação de médicos dermatologistas capazes de prestar o atendimento de urgência na rede credenciada. Por essa razão, de acordo com o demandante, o procedimento foi realizado na rede privada ao custo de R$ 9.700,00 (nove mil e setecentos reais). O reembolso, apesar de solicitado, não foi autorizado pela empresa prestadora de assistência médica.
A Amil, por sua vez, disse que, em pesquisas realizadas no sistema da empresa, não foi localizada solicitação ou negativa de realização do procedimento cirúrgico. Disse que o demandante, de fato, entrou em contato para solicitar o reembolso da cirurgia, porém o plano de saúde contratado pelo beneficiário não inclui o ressarcimento da intervenção cirúrgica realizada.
A juíza de direito que analisou o caso declarou que existe, nos autos, prova suficiente de que não foi apresentado ao demandante médico conveniado habilitado para realizar a intervenção cirúrgica de emergência. Ressaltou que o reembolso integral das despesas médicas e hospitalares ao beneficiário é devido nos casos de urgência ou emergência, quando não houver profissional ou unidade da rede credenciada ou houver recusa no atendimento.
Diante disso, confirmada a recusa contratual imotivada da ré, a Amil Assistência Médica foi condenada a reembolsar ao autor o valor de R$ 9.700,00 (nove mil e setecentos reais), gastos com a realização da cirurgia, e a pagar o dano moral de R$ 3.000,00 (três mil reais).
Cabe recurso da sentença.
Processo: 0755384-23.2019.8.07.0016 – Sentença (inteiro teor para download)
(Com informações do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT)
Inteiro teor da sentença:
Poder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 2JECIVBSB |
Número do processo: 0755384-23.2019.8.07.0016
Classe judicial: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436)
AUTOR: MAURY TORQUATO DA SILVA
RÉU: AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A.
S E N T E N Ç A
Dispensado o relatório, nos termos do art. 38, da Lei nº 9.099/95, passo ao mérito.
Cuida-se de relação de consumo estabelecida por contrato de adesão, reconhecendo-se à espécie a incidência do Código de Defesa do Consumidor (Súmula 608, do STJ), bem como das regras e princípios protetivos a ele inerentes.
A pretensão inicial é indenizatória, ante o argumento de que ocorreu recusa contratual imotivada da ré, no tocante ao reembolso de valor pago pela intervenção cirúrgica sofrida pelo autor.
Segundo a inicial, em 13/08/2019 a médica prescreveu ao autor a intervenção cirúrgica Micrográfica de Mohs, mas a ré não apresentou relação de médicos dermatologistas para prestar o atendimento médico de urgência na rede credenciada, razão pela qual o autor foi submetido ao procedimento de urgência na rede privada, arcando com o custo de R$9.700,00 (nove mil e setecentos reais), cujo reembolso não foi autorizado pela ré.
A necessidade do atendimento médico de urgência foi regularmente atestada (ID 58499274 – Pág. 1) e, por outro lado, não é direito da seguradora, por força de interpretação legal limitativa, deixar de promover a cobertura securitária de procedimento médico necessário. Ademais, o reembolso integral das despesas médicas e hospitalares ao beneficiário do plano de saúde é devido nos casos de urgência ou emergência, quando não houver profissional ou unidade da rede credenciada ou houver recusa no atendimento (STJ AgRg no ARESP 54991/SP e RESP 402.727/SP).
No caso, inconteste que não foi apresentado médico conveniado habilitado para realizar a intervenção cirúrgica prescrita ao autor, configurando-se legítimo o direito pleiteado, para o reembolso do valor de R$9.700,00 (nove mil e setecentos reais), regularmente comprovado (ID 49105930). Vale citar:
JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO URGENTE. REMOÇÃO DE CARCINOMA BASOCELULAR INFLITRATIVO, AGRESSIVO E RECIDIVANTE. CIRURGIA MICROGRÁFICA DE MOHS. PREVISÃO EXPRESSA NO ROL DE PROCEDIMENTOS E EVENTOS EM SAÚDE DA ANS. PROCEDIMENTO DE COBERTURA OBRIGATÓRIA. DESPESAS REALIZADAS PELO BENEFICIÁRIO. ABUSIVIDADE NA NEGATIVA DE COBERTURA INTEGRAL. REEMBOLSO INTEGRAL. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Na hipótese, o autor/recorrido foi diagnosticado com carcinoma basocelular infiltrativo, agressivo e recidivante, a exigir a realização da cirurgia micrográfica de Mohs. Ocorre que ao entrar em contato com o plano de saúde, foi informado que o procedimento não era coberto pelo plano, mas que existia a possibilidade de reembolso no valor de R$ 620,57. Diante disso, o autor/recorrido se viu obrigado a dispor de recursos próprios para custear o procedimento para tratamento da doença que o acometia. 2. Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré, face a sentença que a condenou ao reembolso de R$ 8.200,00, referente às despesas realizadas pelo autor para remoção de carcinoma basocelular, por meio de “cirurgia micrográfica de Mohs”. Sustenta que não houve negativa por parte da seguradora, mas que, de acordo com as cláusulas contratuais, o procedimento possibilitava o reembolso parcial no valor de R$ 620,57. Requer a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido de reembolso. Sem razão o réu/recorrente. 3. A relação jurídica entre as partes é de consumo, uma vez que os contratantes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor, conforme disposto nos art. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, o enunciado nº 296 da Súmula do Colendo do Superior Tribunal de Justiça dispõe que se aplica o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde. 4. O objeto da prestação dos serviços de seguro de saúde está diretamente ligado aos direitos fundamentais à saúde e à vida, os quais demandam tratamento preferencial e interpretação favorável ao paciente. 5. Nesse diapasão, consideram-se abusivas quaisquer cláusulas contratuais que, a pretexto de limitar a cobertura do plano, criam verdadeiros obstáculos à realização dos procedimentos, tornando ineficaz o contrato e provocando evidente desequilíbrio na relação jurídica estabelecida entre as partes, em afronta ao princípio da boa-fé objetiva. 6. Ao plano de saúde é possível estabelecer as doenças que podem ser objeto de cobertura, mas não os tratamentos e procedimentos passíveis de utilização para o alcance da cura (REsp 668.216, Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Julgado em 15/03/2007). 7. Assim, não cabe ao plano de saúde a escolha do exame, tratamento ou procedimento cirúrgico, devendo ser respeitado o pedido formulado pelo profissional médico. 8. Na hipótese, restou incontroverso que o autor/recorrido possui plano de saúde da ré/recorrente, o qual prevê cobertura ambulatorial, hospitalar e obstetrícia (ID nº 13294698, pág. 2). Incontroverso, ainda, que ao necessitar realizar a “cirurgia micrográfica de Mohs” a ré/recorrente informou que o procedimento era passível de reembolso parcial no valor resultante do cálculo realizado de acordo com o contrato de seguro saúde. 9. Não bastasse isso, conforme o Rol de Procedimentos de Saúde definido pela ANS, o procedimento citado é de cobertura obrigatória por planos hospitalares[1]. 10. Desta feita, cabível a restituição integral do montante despendido com procedimento de cobertura obrigatória no tipo de plano informado, conforme consulta feita à ANS[2], o qual foi indicado pelo médico (ID 13294698, pág. 4), que, frise-se, não pode ser impedido de escolher a alternativa terapêutica que melhor convém ao tratamento do paciente. 11. Ademais, não demonstrada a existência de profissionais médicos credenciados aptos a realizar os procedimentos indicados ao paciente que necessita intervenção cirúrgica urgente, conforme prescritos pelo médico responsável, é direito do consumidor procurar o profissional de saúde fora do quadro credenciado, mediante reembolso total das despesas. 12. Pelas razões expostas, irretocável a sentença vergastada. 13. Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. 14. Condenada a parte recorrente ao pagamento das custas processuais. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, ante a ausência de contrarrazões (art. 55, Lei 9.099/95). 15. A súmula de julgamento servirá de acórdão, conforme regra do art. 46 da Lei n.º 9.099/95. [1] http://ans.gov.br/planos-de-saude-e-operadoras/espaco-do-consumidor/o-que-o-seu-plano-de-saude-deve-cobrir/verificar-cobertura-de-plano-de-saude [2] http://ans.gov.br/planos-de-saude-e-operadoras/espaco-do-consumidor/o-que-o-seu-plano-de-saude-deve-cobrir/verificar-cobertura-de-plano-de-saude
(Acórdão 1227336, 07353797720198070016, Relator: CARLOS ALBERTO MARTINS FILHO, Terceira Turma Recursal, data de julgamento: 4/2/2020, publicado no DJE: 11/2/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
No tocante ao dano moral, a incerteza do amparo material contratado agregou sofrimento desnecessário ao segurado, sendo certo que a conduta omissiva da ré atingiu a integridade moral do autor. Com efeito, a assistência à saúde prestada pela livre iniciativa é de relevância pública e, caso não promova ao segurado o amparo material contratado, fere direito fundamental à vida e à dignidade humana, dano que é passível de indenização. Assim, considerando-se que a valoração da compensação moral deve atender ao princípio da razoabilidade, segundo a intensidade e os efeitos da lesão, bem como deve objetivar o desestímulo à conduta lesiva, arbitro o prejuízo moral suportado pelo autor em R$3.000,00 (três mil reais).
Em face do exposto, julgo procedente o pedido inicial para condenar a ré às seguintes obrigações: a) reembolsar ao autor o valor de R$9.700,00 (nove mil e setecentos reais), a ser corrigido monetariamente a partir do desembolso, acrescido de juros legais desde a citação; e b) pagar ao autor o dano moral de R$3.000,00 (três mil reais), a ser corrigido em consonância com o Enunciado da Súmula 362, do STJ, acrescido de juros de mora a partir da citação, extinguindo o processo, com resolução de mérito, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Deixo de condenar a vencida ao pagamento das verbas de sucumbência, por força legal (art. 55, da Lei n.º 9.099/95).
Sentença registrada nesta data. Publique-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, formulado pedido, intime-se a devedora para o pagamento da obrigação constituída, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena da multa prevista no art. 523, §1º, do CPC. Decorrido o prazo, adotar-se-ão as medidas constritivas cabíveis, ficando o credor ciente de que, frustradas as medidas empreendidas, o processo será arquivado (art. 51, da Lei n.º 9.099/95), sem prejuízo do desarquivamento, caso indicados bens penhoráveis, de titularidade da devedora.
Observado o procedimento legal, arquive-se.
BRASÍLIA, DF, 11 de março de 2020.
Assinado eletronicamente por: MARGARETH CRISTINA BECKER 12/03/2020 17:03:37 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam ID do documento: 58939295 |