Ato normativo de menor hierarquia não pode restringir direito garantido por lei, principalmente quando a restrição não se mostra adequada ou necessária à proteção de outro bem. Esse foi o entendimento da Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao conceder a segurança para que a cônjuge de esposo custodiado em unidade prisional pudesse realizar visitas pessoais e sociais ao marido.
Na primeira instância, o pedido de autorização de visita pessoal e social da mulher ao esposo preso havia sido indeferido pelo Juízo da 3ª Vara da Seção Judiciária de Rondônia (RO). Por esse motivo, o presidiário e a mulher apresentaram ao TRF1 um mandado de segurança questionando a legalidade da proibição das visitas, uma vez que todas as exigências necessárias foram cumpridas pelo paciente, que não possuía faltas disciplinares, mas mesmo assim o contato entre o casal ficou restrito à visitação apenas em parlatório, com vidro divisor, por meio de telefone. A proibição ao casal havia sido imposta com base na Portaria do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) nº 54/2016.
Em relação a esse mesmo caso, o TRF1 já havia julgado uma liminar autorizando a visita social da impetrante ao marido na Unidade Prisional Federal de Porto Velho/RO, onde estava custodiado, fato lembrado no voto pelo relator do mandado de segurança, desembargador federal Néviton Guedes. Conforme a decisão liminar que autorizou a visita, a Lei de Execução Penal (7.210/84) assegura sem restrição o direito à visitação no propósito de conferir significado tanto ao direito do acusado de ressocializar-se mediante contato com o mundo externo, como também do direito constitucional de proteção à família (art. 226 da Constituição Federal).
O desembargador federal relembrou ainda, em seu relatório, o motivo pelo qual a visita havia sido suspensa pelo DEPEN: a mulher do paciente estaria sob investigação e respondendo a uma ação penal. “O fato de existir ou não registros positivos de inquéritos ou processos judiciais dos parentes que pretendem a visita nada diz com a possibilidade de violação das regras de segurança do estabelecimento prisional”, afirmou Néviton Guedes. “Ademais, como informado pelo juízo primevo, o óbice que existia contra a impetrante Rafaela dos Santos Rocha, encontra-se superado, não se justificando, assim, a medida tomada para tal desiderato”, ressaltou o magistrado.
A decisão da Seção, que acompanhou o voto do relator, foi unânime.
Processo nº: 0022002-03.2017.4.01.0000/RO
Data de julgamento: 30/08/2017
AL
Autoria: Assessoria de Comunicação Social
Fonte: Tribunal Regional Federal da 1ª Região – TRF1
Ementa
PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO DE VISITA RECONHECIDO POR LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO POR NORMA DE MENOR HIERARQUIA. REGRAS DE MANDELA. POSTERIOR ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL QUE DEU ENSEJO À PROIBIÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.
- Cinge-se a controvérsia sobre a legalidade de ato praticado pelo Juízo Federal da 3ª Vara da Seção Judiciária do Estado de Rondônia que indeferiu o pedido de autorização de visita pessoal e social da impetrante ao seu esposo que está custodiado na Unidade Prisional Federal de Porto Velho/RO, por figurar como investigada em inquérito policial.
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A Lei 7.210/84, em seu art. 41, assegura sem restrição o direito à visitação, o que se insere no propósito de conferir significado tanto ao direito do acusado de ressocializar-se mediante contato com o mundo externo, como também se insere no âmbito do direito constitucional de proteção à família (art. 226 da CF).
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Não se nega a possibilidade de restrição a direito, desde que a restrição revele-se proporcional, num sentido de mostrar-se adequada e necessária à proteção de outro bem ou direito de mesmo ou maior hierarquia. De qualquer jeito, a restrição ao direito conferido por lei deveria vir disposta também em norma legal.
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No caso presente, a restrição imposta não atende a nenhum destes pressupostos, isto é, não se mostra adequada ou necessária à proteção de qualquer outro direito, uma vez que o fato de existir ou não registros positivos de inquéritos ou processos judiciais dos parentes que pretendem a visita nada dizem com a possibilidade de violação das regras de segurança do estabelecimento prisional. Por outro lado, sendo o direito à visita garantido por lei, evidentemente, não poderia sofrer restrição por ato normativo de menor hierarquia, no caso a Portaria DEPEN 54/2016 do Departamento Penitenciário Nacional.
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No Brasil, recentemente o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deu publicidade, em 2016, durante a 232ª Sessão Ordinária, à tradução oficial das chamadas Regras de Mandela, preceitos mínimos da Organização das Nações Unidas (ONU) para o tratamento de presos atualizadas no ano passado pela instituição internacional. O documento oferece balizas para a estruturação dos sistemas penais nos diferentes países e reveem as “Regras Mínimas para o Tratamento de Presos” aprovadas em 1955.
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Como informado pelo juízo a quo, com o arquivamento do inquérito policial no qual a impetrante era investigada, o óbice que existia encontra-se superado, não se justificando, por mais esse motivo, a manutenção do indeferimento da visita social.
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A Procuradoria Regional da República proferiu parecer pela concessão da segurança diante do arquivamento do aludido inquérito policial.
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Segurança concedida.
(TRF1 – MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL N. 0022002-03.2017.4.01.0000/RO. Processo Orig.: 0012090-35.2016.4.01.4100. RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES IMPETRANTE : RAFAELA SANTOS ROCHA E OUTRO(A) ADVOGADO : RJ00076168 – REMILSON DIAS DO NASCIMENTO IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 3A VARA – RO INTERESSADO : JUSTICA PUBLICA. Data de julgamento: 30/08/2017)