O juiz Gustavo Assis Garcia, em atuação na Auditoria Militar do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, condenou um soldado da Polícia Militar pelo crime de lesão corporal culposa a um ano de reclusão no regime aberto. O réu foi acusado de detonar um explosivo e ferir gravemente um civil, que sofreu amputação do dedo indicador direito.
Consta da denúncia que, no dia 5 de outubro de 2013, uma equipe do Grupo de Patrulhamento Tático estava em ronda no Setor Teodoro Alves, em Inhumas. Os agentes do grupo estavam abordando pessoas suspeitas de tráfico de drogas e interpelaram Willian de Souza, que, no momento, passava de bicicleta.
Logo após ser liberado, o rapaz se dirigiu para o local onde deixou seu veículo, sem perceber que um dos policiais havia jogado um artefato explosivo, do tipo bombinha, para dispersar os demais. Além da amputação, Willian sofreu fratura no dedo anelar esquerdo.
Sangrando muito, a vítima disse que foi orientada pelos agentes a enrolar uma camiseta na mão e que não recebeu assistência adequada. Ele procurou o Centro de Atenção Integrada à Saúde (Cais) e foi encaminhado ao Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo).
Culpa e dolo
Na acusação, o Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO) alegou que houve dolo na conduta do policial, isto é, intenção de provocar a lesão. Contudo, ao analisar os depoimentos do réu, dos demais agentes e, inclusive, da vítima, o magistrado considerou que a dinâmica do acidente não demonstra que o réu quis o resultado, apesar de ter aceitado o risco de produzi-lo.
Os relatos ouvidos em juízo apontam que o acusado jogou o artefato em um lote baldio, em direção oposta aos civis presentes e, somente depois, Willian chegou ao terreno. A bombinha demorou alguns segundos para explodir, tempo em que a vítima pegava a bicicleta.
Para Gustavo Assis Garcia a atitude do acusado demonstra culpa consciente – conduta na qual a pessoa prevê o resultado lesivo, embora acredite que tal evento não se realizará, confiando na sua atuação e habilidade –,e não dolo eventual.
“A escolha feita pelo acusado, ao arremessar o explosivo em direção diametralmente oposta ao local onde estavam os civis, denota que permeava seu pensamento certa preocupação com a possibilidade de que a bombinha pudesse atingir alguma pessoa caso a arremessasse para o lado em que estavam os homens abordados, o que é contrário à tese do dolo eventual”, elucidou o juiz.
O magistrado destacou, também, que apesar de reconhecer a culpa consciente “não está se dizendo que a conduta do acusado foi correta, uma vez que seu comportamento não encontra respaldo no procedimento padrão da PMGO. Todavia, mesmo na sua atitude impensada e absurda, escolheu ele ‘dos males o menor’, ao direcionar o artefato explosivo para um local ermo, demonstrando preocupação a fim de não lesionar qualquer pessoa”.
A culpa consciente e o dolo eventual são, conforme o juiz esclareceu, dois institutos do Direito Penal “praticamente idênticos, difíceis de enxergar no caso concreto, e sempre passíveis de causar injustiça. Nesses casos, ocorrendo dúvida, deve-se sempre pesar sobre o réu a punição menos severa, para fazer jus ao princípio do in dubio pro reo (em latim, com tradução livre ‘na dúvida, a favor do réu’)”.
Dessa forma, Gustavo Assis Garcia desclassificou a imputação do crime previsto no artigo 209, parágrafo 2 do Código Penal Militar, para condenar o réu nas penas do artigo 210, que prevê lesão culposa. Para a fixação da pena, o juiz ponderou, entre outros quesitos, que a circunstância do fato se deu no período noturno, o que dificultou a visualização do artefato pela vítima, que foi utilizado um produto não oficial e, ainda, a falta de preparo do réu, por agir em desconformidade com a corporação.
Considerando a vida pregressa do acusado, sem antecedentes, o magistrado concedeu o benefício da suspensão condicional da pena, pelo período de dois anos, mediante condições de não se ausentar da jurisdição, no caso o Estado de Goiás, não frequentar casas de bebidas alcoólicas e não mudar de endereço, sem aviso prévio. (Centro de Comunicação Social do TJGO)