De acordo com o ministro Gilmar Mendes, decisões que permitem o abate interpretam a proteção aos animais em sentido inverso ao da Constituição.
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão, em âmbito nacional, de todas as decisões administrativas ou judiciais que permitam o sacrifício de animais silvestres ou domésticos apreendidos em situação de maus tratos em decorrência de interpretação ilegítima de dispositivos da Lei dos Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998).
Relator da Arguição de Descumprimento Fundamental (ADPF) 640, ministro Gilmar Mendes deferiu medida liminar requerida pelo Partido Republicano da Ordem Social (Pros). A liminar reconhece a ilegitimidade da interpretação dos artigos 25 (parágrafos 1º e 2º) da Lei dos Crimes Ambientais, de diversos dispositivos do Decreto 6.514/2008 e demais normas legais ou infralegais que tratem do abate de animais apreendidos nessas condições.
Galos de briga
Na ação judicial, o partido político cita como exemplo decisão judicial que permitiu o abate de galos de briga apreendidos, com fundamento em déficits estruturais e financeiros para a sua manutenção adequada. Essa decisão considerou ainda que as condições em que as aves se encontravam também violavam os preceitos fundamentais de defesa do meio ambiente. De acordo com o Pros, várias outras decisões judiciais ou administrativas autorizam, como regra, o sacrifício dos animais apreendidos.
Para o partido político Pros, essa prática ofende preceitos fundamentais inscritos nos artigos 5º (inciso II) e 225 (parágrafo 1º, inciso VII), da Constituição Federal e, ao invés de proteger os animais apreendidos em situação de maus tratos, permite a crueldade, desrespeitando sua integridade e sua.
Proteção constitucional
Ao decidir, o ministro Gilmar Mendes lembra inicialmente que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem admitido o cabimento de ADPF para a impugnação de conjunto de decisões judiciais que possam causar a violação a preceitos fundamentais, de modo a possibilitar a resolução de questão constitucional de forma ampla, geral e irrestrita, com a produção de efeitos para todos. No caso, lembra que a Constituição Federal impõe expressamente a proteção à fauna e proíbe qualquer espécie de maus-tratos aos animais (artigo 225, inciso VII) e que, de acordo com a doutrina, essa proteção abrange tanto os animais silvestres como os domésticos ou domesticados. Ele lembrou que, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2514, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional lei de Santa Catarina que permitia rinhas de galo.
Também segundo o relator, a legislação infraconstitucional segue a mesma linha de proteção ao bem-estar dos animais apreendidos em situação de risco. A Lei dos Crimes Ambientais, por exemplo, estabelece que, nessas circunstâncias, os animais serão “prioritariamente libertados em seu habitat” ou entregues a “jardins zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas, para guarda e cuidados sob a responsabilidade de técnicos habilitados”.
Dano irreversível
Ao comentar a decisão judicial citada pelo Pros que permitiu o abate dos galos, o ministro concluiu que a autoridade judicial se utilizou da norma de proteção aos animais em sentido inverso ao estabelecido pela Constituição Federal. Na ausência de autorização legal para o abate de animais nesse caso específico, Gilmar Mendes verificou que a urgência da situação demanda a concessão da liminar. “Uma vez consumadas as práticas de abate e destruição de animais apreendidos, tem-se a irreversibilidade fática dos efeitos das decisões questionadas”, concluiu.
Processo: ADPF 640 – Decisão (inteiro teor para download)
(Com informações do Supremo Tribunal Federal – STF)