Por maioria de votos, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou liminar de dezembro do ano passado e revogou a prisão preventiva do ex-governador da Paraíba Ricardo Coutinho, impondo outras medidas cautelares. O político é investigado pelos crimes de fraude à licitação, corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro, todos apurados no âmbito da Operação Calvário.
A mesma decisão vale para a prefeita do município do Conde (PB), Márcia Lucena, além de cinco outros investigados. Nesses casos, o julgamento do colegiado foi unânime.
As medidas cautelares determinadas em substituição às prisões preventivas são as seguintes: comparecimento periódico em juízo; proibição de manter contato com os demais investigados (com exceção, no caso de Ricardo Coutinho, de seu irmão Coriolano Coutinho); proibição de ausentar-se da comarca domiciliar sem autorização do juízo; e afastamento da atividade econômica que tenha relação com os fatos apurados (medida voltada para os empresários investigados na operação).
No dia 21 de dezembro de 2019, durante o plantão judicial, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho havia concedido liminar para determinar a soltura do ex-governador Ricardo Coutinho, por entender que não estava demonstrada a necessidade da prisão preventiva naquele momento.
Ao julgar o mérito do Habeas Corpus (HC), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que, apesar dos indícios do cometimento dos delitos investigados na Operação Calvário, não estão presentes os requisitos para a manutenção da prisão preventiva de Coutinho, especialmente porque o político já deixou o cargo de governador. Assim, para o colegiado, está ausente o requisito da contemporaneidade entre os delitos apurados e a decretação da prisão.
Ademais, o colegiado considerou que, desde a libertação de Ricardo Coutinho, não houve notícia de que ele tenha interferido nas investigações ou cometido qualquer ato ilícito.
Desvios milionários
A Operação Calvário investigou esquema criminoso, supostamente liderado por Ricardo Coutinho, que teria desviado cerca de R$ 134.000.000,00 (cento e trinta e quatro milhões de reais) dos setores de saúde e educação do estado da Paraíba. De acordo com o Ministério Público do Estado da Paraíba (MPPB), as operações do grupo envolveriam o repasse de recursos ilícitos por meio de organizações sociais escolhidas para gerir hospitais, o loteamento de empregos nas unidades hospitalares entre políticos aliados e fraudes a licitação na área da educação, mediante o pagamento de propina.
De acordo com o Ministério Público da Paraíba (MPPB), os delitos teriam sido praticados durante os dois mandatos de Ricardo Coutinho à frente do Governo da Paraíba, entre 2010 e 2018.
A prisão preventiva do ex-governador e de 17 outros investigados foi decretada pelo Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) no mês de dezembro de 2019. Na decisão, o Tribunal de Justiça da Paraíba considerou, entre outros elementos, a sofisticação do esquema criminoso e a influência de Ricardo Coutinho na administração pública paraibana, inclusive porque parte da equipe do político ainda estaria atuante no governo.
O Tribunal de Justiça da Paraíba apontou ainda o risco de intimidação a testemunhas e de ocultação de provas.
Sem elementos concretos
No pedido de habeas corpus, a defesa afirmou que a prisão preventiva de Ricardo Coutinho foi decretada aproximadamente um ano depois do término de seu mandato como governador, o que afastaria o elemento da contemporaneidade entre os fatos investigados e a medida cautelar mais grave. A defesa também questionou a produção de provas – e a consequente tomada de decisão pelo Tribunal de Justiça da Paraíba – baseada exclusivamente na palavra de colaboradores.
A relatora do habeas corpus, ministra Laurita Vaz, destacou a necessidade do Superior Tribunal de Justiça dar firme resposta no combate à corrupção e aos crimes que lesam os cofres públicos. No entanto, a ministra ponderou que essa função tem de ser realizada com “isenção e austeridade”, tendo em vista que as medidas cautelares não podem servir como antecipação de pena, pois o cidadão tem a seu favor a presunção de inocência e possui direito ao devido processo legal.
No caso dos autos, Laurita Vaz afirmou que o decreto prisional do TJPB não demonstra, de forma categórica, que Ricardo Coutinho atualmente agiria no esquema criminoso, já que não exerce cargo político. Segundo a ministra, ainda que o tribunal paraibano tenha apontado que persistiriam as relações de Ricardo Coutinho com o atual governo estadual, não há referência concreta sobre quais seriam os agentes que ainda atuariam na organização criminosa e que papéis eles desempenhariam no grupo.
“Nesse contexto, para se considerar necessária a prisão para garantia da ordem pública, a potencial ação delituosa deve denotar risco atual, não sendo bastante indicar supostas fraudes, já há muito concluídas, sem a efetiva demonstração da possibilidade concreta de repetição de crimes da mesma espécie”, concluiu a ministra Laurita Vaz.
Ao estabelecer as medidas cautelares, a ministra Laurita Vaz ressaltou a possibilidade de que a Justiça paraibana fixe as restrições adicionais que considerar pertinentes e alertou sobre a possibilidade de nova decretação de prisão caso as medidas cautelares sejam descumpridas.