TRF3 decide que MPF pode solicitar informações diretamente à Receita Federal

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Para Quinta Turma, a doutrina e a jurisprudência têm retirado a proteção de dados bancários e fiscais do direito à intimidade

TRF3 decide que MPF pode solicitar informações diretamente à Receita Federal
Créditos: sebra / Shutterstock.com

A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) decidiu que o Ministério Público Federal (MPF) pode requisitar informações e documentos diretamente à Receita Federal em seus procedimentos investigatórios. O acórdão, por maioria, foi proferido em habeas corpus impetrado por uma ré acusada de fraudes em sociedades empresariais e em um leilão realizado em 2010. Ela alegava que o MPF não poderia solicitar as informações à Receita Federal sem prévia autorização judicial.

Em seu voto, o relator do caso, desembargador federal Paulo Fontes, explicou que a doutrina e a jurisprudência têm retirado a proteção de dados bancários e fiscais do direito à intimidade, previsto no artigo 5º, inciso X, da Constituição. Para ele, na atualidade, em “momento de alastramento da corrupção e da criminalidade organizada como um todo, inclusive de terrorismo”, os órgãos de investigação devem ser fortalecidos nas suas funções.

O magistrado também lembrou que a Constituição e a Lei Complementar 75/93, que organiza o Ministério Público da União, garantiram ao órgão a possibilidade de requisitar informações e documentos nos seus procedimentos investigatórios. O que ocorreria não seria propriamente a quebra de sigilo, mas a transferência de sigilo fiscal ao Ministério Público. Desse modo, o caráter sigiloso das informações seria mantido, mas compartilhado com o órgão ministerial.

O voto destaca que a nova ordem constitucional põe os membros do Ministério Público “ao abrigo de injunções políticas e outras formas de pressão que poderiam macular uma atuação isenta e voltada à consecução do interesse público”, equiparável ao que ocorre com os magistrados. Também ressaltou que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a possibilidade de o MP investigar crimes de forma direta – o chamado “poder investigatório do Ministério Público em matéria penal”.

A partir desse estatuto jurídico e do conjunto de funções desempenhadas pelo MP, o relator estabelece uma analogia com o tratamento dado aos agentes da Receita Federal em matéria de sigilo bancário. “Se a Receita Federal, com atribuições relevantes, mas certamente não mais que aquelas desempenhadas pelo Parquet, pode requisitar diretamente dados bancários, por que não poderia fazê-lo o próprio Ministério Público?”, indaga.

Além disso, a decisão salienta que os instrumentos internacionais e organizações de que o Brasil faz parte aconselham firmemente a flexibilização do sigilo bancário como forma de aprimorar o combate à criminalidade organizada. Como exemplo, citou a Recomendação nº 9 do GAFI – Grupo de Ação Financeira, organização encarregada do combate à lavagem de dinheiro em âmbito mundial.

O relator conclui o voto lembrando que os órgãos de direção do Ministério Público têm-se empenhado para regular a atuação investigatória de seus membros, de maneira a evitar abusos. É o caso da Resolução nº 77, do Conselho Superior do Ministério Público Federal, que proíbe a expedição de intimações e requisições sem que seja instaurado procedimento investigatório formal. No julgado pela Quinta Turma, o caso já resultou em ação penal, que tramita no primeiro grau da Justiça Federal.

Habeas Corpus 0020412-68.2016.4.03.0000/SP – Acórdão

Autoria: Assessoria de Comunicação Social do TRF3
Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3)

Ementa:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. REQUISIÇÃO DE DADOS FISCAIS DIRETAMENTE PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CONSTRAGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. 1. Interpretação do art. 5º, X, da Constituição que deve guardar consonância com a realidade atual. Vivemos momento de alastramento da corrupção e da criminalidade organizada como um todo, inclusive do terrorismo, de maneira que os órgãos de investigação devem ser fortalecidos nas suas funções. 2. Por outro lado, a Constituição de 1988 e a Lei Complementar 75/93, que organiza o Ministério Público da União, garantiram ao órgão a possibilidade de requisitar informações e documentos nos seus procedimentos investigatórios (CF, art. 129, VI e VIII; LC 75/93, art. 8º, II, IV, V e VII). A referida Lei Complementar é explícita em afastar o sigilo, que fica transferido ao Ministério Público (art. 8º, II). 3. Elevado estatuto jurídico dos membros do Ministério Público na nova ordem constitucional, equiparável ao da magistratura, que de forma objetiva põe seus membros ao abrigo de injunções políticas e outras formas de pressão que poderiam macular uma atuação isenta e voltada à consecução do interesse público. 4. Supremo Tribunal Federal que já reconheceu a possibilidade de o Ministério Público investigar crimes de forma direta – o chamado poder investigatório do Ministério Público em matéria penal. 5. Estatuto jurídico e conjunto de funções desempenhadas pelo Ministério Público que estão a propiciar analogia com o tratamento dispensado, em matéria de sigilo bancário, aos agentes da Receita Federal. Se a Receita Federal, com atribuições relevantes, mas certamente não mais que aquelas desempenhadas pelo Parquet, pode requisitar diretamente dados bancários, por que não poderia fazê-lo o próprio Ministério Público? O Ministério Público estaria para tal amparado na Constituição e nas disposições da referida Lei Complementar. 6. Instrumentos internacionais e organizações de que o Brasil faz parte aconselham firmemente a flexibilização do sigilo bancário como forma de aprimorar o combate à criminalidade organizada. Nesse sentido, a Recomendação nº 9 do GAFI-Grupo de Ação Financeira – organização internacional encarregada do combate à lavagem de dinheiro em âmbito mundial -, além de manifestações específicas que já foram dirigidas ao Brasil. 7. Órgãos de direção do Ministério Público, em todos os seus ramos, que se têm empenhado para regular a atuação investigatória dos seus membros, de maneira a evitar abusos – como é o caso da Resolução nº 77 do Conselho Superior do Ministério Público Federal, que, por exemplo, proíbe a expedição de intimações e requisições sem que seja instaurado procedimento investigatório formal. 8. Ordem denegada. (TRF3 – HABEAS CORPUS Nº 0020412-68.2016.4.03.0000/SP 2016.03.00.020412-7/SP. RELATOR: Desembargador Federal PAULO FONTES. IMPETRANTE: DANYELLE DA SILVA GALVÃO: RENATO SCIULLO FARIA: RICARDO FONSECA CHIARELLO, PACIENTE: HELENA PLAT ZUKERMAN. ADVOGADO: SP340931A DANYELLE DA SILVA GALVÃO. IMPETRADO(A): JUÍZO FEDERAL DA 3 VARA DE SANTO ANDRÉ>26ª SSJ>SP CO-RÉU: MAURO ZUKERMAN. No. ORIG. : 00030848020164036126 3 Vr SANTO ANDRÉ/SP)

Wilson Roberto
Wilson Robertohttp://www.wilsonroberto.com.br
Advogado militante, bacharel em Administração de Empresas pela Universidade Federal da Paraíba, MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, professor, palestrante, empresário, Bacharel em Direito pelo Unipê, especialista e mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Atualmente é doutorando em Direito Empresarial pela mesma Universidade. Autor de livros e artigos.

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