Empresa de transporte por aplicativo Uber deve indenizar motorista assaltado
A Quarta Turma Cível do Colégio Recursal manteve sentença, da Primeira Vara do Juizado Especial Cível de Campinas, em São Paulo, que determinou que a empresa de transporte por aplicativo Uber indenize um motorista, que faz uso do aplicativo Uber, assaltado após pegar passageiros selecionados pelo aplicativo.
A Uber deverá indenizar o motorista em R$ 17.000,00 (dezessete mil reais) a título de danos morais e mais R$ 10.000,00 (dez mil reais) por danos materiais.
Há nos autos que o motorista teve seus bens roubados e sofreu lesões corporais, o que causou abalos morais a sua pessoa.
Em sua contestação, a empresa Uber afirmou ser parte ilegítima, tendo em vista que sua responsabilidade se restringiria a aproximar o motorista do usuário do aplicativo.
De acordo com a juíza de direito Renata Manzini, relatora do recurso inominado, é dever da Uber prestar serviços com a prudência necessária para reduzir os riscos dos motoristas parceiros.
“A ré aufere lucro com a intermediação entre motorista e passageiro, e atrai sua clientela sob a alegação de que não há viagens anônimas e que conhece quem está utilizando seu aplicativo, logo, ao ocorrer tamanho dano ao motorista que utiliza a plataforma, deve se responsabilizar por ele, como bem delineado na sentença.” (Com informações do Tribunal de Justiça de São Paulo).
Processo n° 1034896-11.2017.8.26.0114 – Acórdão (clique aqui para baixar o inteiro teor)
Acórdão:
EMENTA: APLICATIVO UBER. ASSALTO A MÃO ARMADA A MOTORISTA QUE UTILIZA APLICATIVO PARA EFETUAR TRANSPORTE DE PASSAGEIRO. RESPONSABILIDADE DA PLATAFORMA UBER. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. SENTENÇA MANTIDA. O autor sagrou-se vencedor em primeiro grau, em processo em que alega ser motorista devidamente cadastrado na plataforma UBER e que, ao efetuar o transporte de passageiros selecionados pela plataforma, teve seus bens subtraídos, sofreu lesões corporais e teve sua moral abalada, pleiteando indenização por danos materiais e morais. A ação foi julgada procedente e recorreu a ré. A ré, em seu recurso, reitera os argumentos anteriores: que é parte ilegítima para figurar no polo ativo da ação; comparou seus serviços aos de corretor de imóveis; imputou a culpa do ato violento ao Estado; alegou que os danos materiais não foram devidamente comprovados e que a indenização pelos danos morais não deve subsistir. A ré, pretendendo isentar-se de qualquer responsabilidade em relação ao autor, alega que apenas aproxima o motorista do usuário, assim como o corretor aproxima comprador de vendedor. Alega que fatos que ocorrem após tal intermediação não podem ser atribuídos ao corretor, nem tampouco, nesse paralelo, à ré, no que tange à prestação de seus serviços. Entretanto, a partir desse pressuposto, não se poderia deixar de observar que a obrigação do corretor de imóveis é de executar a intermediação com a prudência que o negócio requer, sob pena de responder por perdas e danos. Se o corretor de imóveis, a pretexto de levar à residência do vendedor compradores interessados, faz nela adentrar bandidos, que assaltam o imóvel e torturam seus moradores, responderá por falta de diligência. Nesse sentido, a ré propagandeia (fl. 39) que “ao se cadastrarem, todos os usuários precisam informar nome, e-mail e número de telefone antes de poderem solicitar uma viagem. Dessa forma, você sabe quem está viajando com você (E NÓS TAMBÉM)” (grifei). Ora: se promete que o “motorista parceiro” utiliza a UBER porque ele, e a UBER, saberão com quem se está viajando, não pode depois se desculpar pela falta de critério no cadastramento do usuário. Se a ré cadastra bandidos como usuários, deixa de executar seus serviços com a prudência necessária para amenizar riscos a que estão expostos os motoristas que utilizam sua plataforma, descumprindo a obrigação que assumiu na oferta de seus serviços (fls. 39). Nesse contexto, a montagem de estrutura mais ou menos segura, mais ou menos eficiente – para o atendimento de quem contrata seus serviços – é escolha da ré e reflete nas suas margens de lucro. Assim, se escolhe estrutura que leva a atendimento precário, que não zela pela segurança do usuário (tanto motorista quanto passageiro), o faz por livre opção e, de fato, porque estruturas melhores viriam a custar mais e, por isso, reduziriam sua margem de lucro. Auferindo melhores resultados financeiros, arca, porém, com os ônus dos erros provocados pelo sistema eleito. No caso em tela, a ré aufere lucro com a intermediação entre motorista e passageiro, e atrai sua clientela sob a alegação de que não há viagens anônimas e que conhece quem está utilizando seu aplicativo, logo, ao ocorrer tamanho dano ao motorista que utiliza a plataforma, deve se responsabilizar por ele, como bem delineado na sentença. Outro ponto que merece destaque é a insurgência da ré quanto ao valor atribuído a título de indenização pelos danos materiais causados ao autor. Alega que os danos materiais foram estimados e pleiteados de forma genérica e infundada. No entanto, não prospera tal alegação. A inicial trouxe documentos que pormenorizaram os danos materiais (fls. 35/37). Ademais, embora o boletim de ocorrência não seja prova absoluta dos fatos nele contidos, revela-se documento dotado de presunção de veracidade, que pode ser elidida por outras provas em sentido contrário. Entretanto, a ré não trouxe aos autos provas capazes de desconstituir tal veracidade, ônus que lhe competia. Acrescente-se que o boletim de ocorrência (fls. 21/24) foi lavrado no mesmo dia da ocorrência dos fatos, o que dá credibilidade à afirmação de que o roubo dos objetos nele descrito realmente se consumou. Ademais, decorre da própria atividade do motorista que utiliza a plataforma UBER possuir carro e aparelho celular. As lesões foram comprovadas pelo exame de corpo de delito, logo, necessário o dispêndio de dinheiro com medicação, também devidamente comprovado. Nos autos, ainda, se comprova a propriedade do veículo e se juntam as cotações de valor dos bens. Diante de todos os elementos constantes dos autos e não contrapostos por qualquer outra prova trazida pela ré, comprovado o dano material, que deve ser indenizado como fixado na sentença. No mais, a ré não foi capaz de infirmar qualquer outro ponto da sentença, que deve ser mantida tal como lançada. Assim, pelo meu voto, DEIXO DE DAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo a sentença na íntegra, por seus próprios fundamentos, na forma do art. 46 da Lei 9.099/95. Condeno a recorrente a pagar eventuais custas e os honorários advocatícios, que arbitro em 20% sobre o valor da condenação. RENATA MANZINI Juíza Relatora
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