Acusado que rompeu tornozeleira eletrônica para cometer crime é condenado por tentativa de latrocínio

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O juízo da Vara Criminal da Comarca de Mafra (SC) condenou um acusado a 11 anos e 1 mês de prisão, em regime inicial fechado e sem direito a recorrer em liberdade, pelo crime de tentativa de latrocínio ocorrido em maio de 2022, no bairro Vila Ivete.

Segundo a denúncia, a vítima, uma mulher, foi surpreendida pelo acusado nas primeiras horas da manhã, quando se dirigia para o trabalho. Com extrema violência, o réu tomou para si uma sacola com pertences da vítima, a golpeou no abdômen por 2 vezes com instrumento cortante e evadiu-se do local.

A autoria do crime foi confirmada pela ofendida, por meio de reconhecimento fotográfico. Em oitiva, o pai do acusado alegou que o fato chegou ao seu conhecimento por meio de terceiros, no entanto, não havia como entrar em detalhes por não estar presente. Entretanto, disse que o filho rompeu a tornozeleira eletrônica que o monitorava e confirmou sua condição de dependente químico. Capturado, o réu exerceu o direito de não se manifestar.

Na decisão, o juiz de direito André Luiz Lopes de Souza ressaltou que as provas apresentadas são suficientes para a condenação do réu no caso delituoso. “É irrelevante para a caracterização da tentativa de latrocínio a ocorrência de lesão corporal de qualquer natureza, bastando que o acervo probatório demonstre a intenção do agente em matar a vítima ou terceiro com o fim de praticar ou assegurar a subtração de coisa alheia”, destacou.

Cabe recurso da decisão ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC.

Autos n. 5003242-41.2022.8.24.0041/SC – Sentença

(Com informações do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC)

Lei de Execução Penal - STJ - STF
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SENTENÇA

ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Vara Criminal da Comarca de Mafra

Av. Cel. José Severiano Maia,, 863 – Bairro: Centro – CEP: 89300330 – Fone: (47) 3130-8335 – Email: [email protected]

Ação Penal – Procedimento Ordinário Nº 5003242-41.2022.8.24.0041/SC

 

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RÉU: STEFAN ALESSY NOGUEIRA

SENTENÇA

O Ministério Público de Santa Catarina, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, ofereceu denúncia contra STEFAN ALESSY NOGUEIRA, brasileiro, solteiro, desempregado, natural de Rio Negro/PR, nascido em 1º de outubro de 1975, com 46 anos de idade ao tempo dos fatos, filho de Jacira Rodrigues Nogueira e João Maria Nogueira, portador do CPF n. 004.782.979-63, residente na Rua Pioneira Augusta Schultz, n. 139, Bairro Santa Filomena, Mafra-SC, atualmente recolhido na Colônia Penal Agrícola de Piraquara-PR, pela prática do seguinte fato delituoso:

“No dia 31 de maio de 2022, por volta das 6h30min da manhã, na Rua Vereador Gumercindo Mares, próximo à Escola Tenente Ary Rauen, Bairro Vila Ivete, o denunciado Stefan Alessy Nogueira, agindo de modo livre e consciente e movido pelo intuito de assenhoramento definitivo do patrimônio alheio, subtraiu, para si, coisas alheias móveis pertencentes à vítima Kiara Sabatke Grein, mediante uso de violência que somente não resultou na morte da vítima por circunstâncias alheias à vontade do denunciado.

Isso porque, nas condições de tempo e espaço anteriormente descritas, o denunciado Stefan abordou a vítima Kiara enquanto ela andava sozinha na rua dirigindo-se para o trabalho, anunciando um assalto e tentando puxar uma bolsa que a ofendida trazia consigo. 

Ato contínuo, o denunciado, golpeou o abdômen da vítima por duas vezes com instrumento cortante, causando-lhe as lesões retratadas nas fotografias do e. 1, docs. 5 e 6 do IP apenso e descritas no Laudo Pericial n. 2022.11.00787.22.001-88, anexo, consistentes em “feridas perfuroincisas com equimoses peri lesionais em linha axilar média de tórax e abdômen direitos”, assumindo o risco de ocasionar a morte de Kiara com tal conduta, resultado esse que somente não se concretizou por circunstâncias alheias à vontade de Stefan, na medida em que a vítima logrou êxito em buscar socorro médico posteriormente. 

A seguir, o denunciado evadiu-se do local, na posse mansa e pacífica da sacola que a vítima trazia consigo e dos bens que estavam em seu interior, que não foram recuperados, notadamente um carregador de celular da marca Motorola G9 power, um pote de um quilo de margarina da marca Qualy, 400 gramas de carne moída congelada, um remédio calmante e um remédio Captropril, bens esses avaliados em R$ 206,00 (duzentos e seis reais – termo de avaliação do e. 1, doc. 1, p. 13 do IP apenso). 

Assim agindo, o denunciado Stefan Alessy Nogueira praticou a conduta prevista no preceito primário do artigo 157, § 3º, inciso II, c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal”.

A denúncia foi recebida em 22.06.2022 (evento 3).

O réu foi citado, tendo apresentado defesa prévia por meio da Defensoria Pública Estadual (evento 15).

Ausentes as hipóteses dos art. 397, do CPP, seguiu-se com a designação de audiência de instrução e julgamento

A solenidade restou fracionada, ocasiões onde procedeu-se a oitiva de testemunhas, uma inclusive no formato de Depoimento Especial previsto na Lei n. 13.431/17. Ao final, sobreveio o interrogatório do réu (eventos 45; 72 e 91).

Não houve requerimentos na fase do art. 402, do CPP.

As alegações finais foram apresentadas de forma oral. O Ministério Público requereu a condenação do acusado nos moldes da denúncia, pugnando ainda pela fixação de valor indenizatório para a vítima, com lastro no art. 387, inc. IV, do CPP. A defesa, por sua vez, alegou anemia probatória, sustentando que a prova está alicerçada em reconhecimento por fotografia, sistemática que não é mais admitida. E, alternativamente, pela desclassificação do delito de latrocínio, argumentando que as lesões apresentadas pela vítima classificam-se como leves.

É o relatório. Decido.

Cuida-se de ação penal movida contra STEFAN ALESSY NOGUEIRA, por infração ao art. 157, § 3º, inciso II, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal.

Sobre o crime em tela, dispõe o Código Penal:

Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: (…)

§ 3º  Se da violência resulta: (…)

 II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa.

Art. 14 – Diz-se o crime:

II – tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

(…) Parágrafo único – Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços

A materialidade está consubstanciada nos autos, especialmente por meio do Boletim de Ocorrência, do Laudo Pericial atestando os ferimentos na vítima; pelo termo de avaliação direta, bem como, pelo termo de reconhecimento de pessoa por fotografia (evento 1, IP).

A autoria é inconteste.

Veja-se que a vítima Kiara Sabatke Grein, em Juízo, narrou: “Que acompanhada de seu filho estava se deslocando à escola próxima a sua residência, sendo abordada pelo acusado por trás e anunciado o assalto. Que o acusado tentou tirar sua sacola, porém não conseguiu. Que o acusado puxava a sacola e dava golpes, perfurando dois órgãos, sendo que uma delas chegou a encostar no seu rim. Que não conseguiu identificar o objeto utilizado pelo acusado, somente que ele tinha algo pra fora da mão em torno de 8 a 10 cm, mas nada pontiagudo e sim algo mais quadrado. Que talvez o acusado batia mais com a mão do que com o objeto que perfurava. Que na hora sentiu que o acusado bateu, mas acreditou que não tivesse sido perfurada. Que o acusado correu sentido à residência da depoente. Que após o ocorrido foi pra escola e chegando lá percebeu que estava sangrando. Que conseguiu perceber que o acusado tinha barba rala e meio branca e vestia uma jaqueta verde e blusa de moletom com um detalhe vermelho ou laranja e tinha capuz. Que usava o capuz. Que aparentava um senhor de 60 anos. Que seu filho viu e disse que era um senhor de idade e quando mostraram uma fotografia seu filho reconheceu o masculino. A vítima confirma que pelas fotos mostradas era a pessoa que a esfaqueou. Que ficou 02 meses pegando atestado, pois não aguentava a dor na região, que não conseguia se movimentar. Que recuperou somente sua bolsa, a qual foi jogada pelo acusado na frente da sua residência, bem como o carregador de celular que estava dentro da bolsa. Os remédios foram achados jogados na rua. Que seu filho ficou muito traumatizado e não dorme mais sozinho, tendo que iniciar tratamento psicológico devido ao ocorrido. A vítima confirmou novamente que a pessoa reconhecida na Delegacia é a mesma que a esfaqueou. Que nunca viu essa pessoa antes. Que próximo ao ocorrido não tinha mais pessoas, somente seu filho. (Evento 45 – VÍDEO2)

A testemunha João Maria Nogueira, genitor do acusado, disse: “Que ouviu falar que Stefan deu uma facada numa moça, mas não sabe seu nome. Que o acusado comentou com a sua vizinha que esfaqueou. Que o acusado não comentou sobre o acontecido, porém disse que se o depoente não entregasse a televisão para comprar drogas iria destruir a casa. Que seu filho levou tudo o que (depoente) tinha de valor. Que entregou a televisão ao acusado. Que não pode afirmar que foi o acusado que deu a facada, pois não viu o ocorrido. Que o acusado tirou a tornozeleira, mas não na sua residência, a qual foi entregue e o depoente guardou e entregou para a polícia. Que a faca era de cozinha, fina e cortava bem. Que era essa a faca que estava faltando na sua residência. Que o acusado não falou o local que colocou a faca ou se a jogou. Que o acusado pegou aspirador, aquecedor, televisão e outras coisas de valor da casa (do depoente) para comprar drogas”. (Evento 45 – VÍDEO2)

Seguinte, a testemunha Maria do Carmo Nogueira relatou: “Que o acusado falou que havia comparecido no Carroça, brigou e esfaqueou um rapaz. Que ele estava drogado. Que ele não comentou que havia esfaqueado a menina, soube pelos comentários de outras pessoas. Que o acusado comentava que sempre carregava a faca e aparecia na sua casa (da depoente) portando-a. Que ele chegava na sua casa com outros objetos, chave de fenda, estilete. Ainda, pegou dinheiro e carrinho de mão para comprar drogas”. (Evento 45 – VÍDEO2)

O menor Caio Manoel Grein, em depoimento especial, disse: “Que sabe que o preso morava na Amola Flecha. Que soube que ele pegou (incompreensível) do pai dele e trocou por drogas. Não lembra do nome. Que aconteceu com a sua mãe. Estavam indo para o trabalho e ele veio correndo por trás e quando viraram ele estava gritando “assalto, assalto”. Que tentou pegar a bolsa da mãe, mas ficou enroscada no braço. Que ele esfaqueou a sua mãe. Que a mãe só soube que tinha cortado quando chegaram na escola, pois ela havia perguntado se estava sangrando e, então, respondeu que sim. Que depois que esfaqueou, ele passou na frente da casa de seu(do depoente) pai. Que a sua mãe pediu as imagens das câmeras da vizinha, mas como tinham árvores não frente não deu para ver. Que estava andando com sua mãe de mãos dadas e não sabe se ele tentou pegar a sua mochila, mas ele empurrou para o lado e quase acertou no muro. Que ele estava com uma jaqueta verde, com detalhes laranja/vermelho no ombro ou no peito (fez gestos) e estava usando um capuz. Que ele não tirou o capuz. Que não sabem qual o objeto que ele usou para cortar a mãe. Que depois que pegou a bolsa da mãe ele saiu correndo. Tinha carregador Motorola, margarina e um pouco de carne moída. Que conseguiu ver mais ou menos o rosto dele, tinha cabelo branco, uma barba, aparentava ter 60 a 70 anos. Que ele jogou a bolsa quando viu que tinha só um carregador, a margarina e a carne moída. Que a amiga da sua mãe viu no canto da rua uma bolsa vermelha. Que a bolsa da sua mãe era vermelha. (…) Disse que não foi na Delegacia, mas sua mãe sim. Que soube que ele tinha 42 anos, porque tinha uma amiga da sua mãe que é faxineira falou que sabia a idade dele. Que acha que ela conhecia ele. Que quando pegaram ele encontraram uma faca de cortar pão, uma tesourinha de escola e outra tesoura grande cortada ao meio. Que chegou a ver duas ou três fotos do assaltante no celular da sua mãe. Que acha que as fotos foram mandadas do whatsapp da polícia. Tinha uma foto que ele estava com a roupa verde, outra que ele estava deitado no chão com roupa vermelha e uma que ele estava de pé, acha que também com roupa vermelha. Que quando viu a foto era parecia a mesma pessoa, mas quanto estava com a roupa verde era diferente é porque na outra foto ele já estava mais barbudo. Que o assaltante era calvo”. (Evento 72 – VÍDEO1)

Em interrogatório, o réu Stefan Alessy Nogueira permaneceu em silêncio – (Evento 91 – VÍDEO1)

Tem-se então que vítima Kiara Sabatke Grein reconheceu o acusado com sendo o autor do ilícito. Do termo de reconhecimento (evento 1, p. 14 do IP), retira-se que lhe foi mostrado 4 fotografias de pessoas semelhantes, instante em que ela reconheceu o acusado, sobretudo em razão da barba que usava.

Em juízo, a vítima confirmou o reconhecimento.

No mesmo rumo, o menor Caio Manoel Grein, em depoimento especial, confirmou ter visto fotografias do acusado no celular de sua mãe e, a partir disso, reconheceu-o como autor do fato.

No ponto, registre-se que “não obstante recente posição firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, interpretando o art. 226 do CPP, no sentido de que “a inobservância de tal procedimento enseja a nulidade da prova e, portanto, não pode servir de lastro para sua condenação” (HC 598.886/SC, rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, j. em 27.10.2020), é certo que referido entendimento fez questão de consignar que esta prova não pode servir para condenação, “a menos que outras provas, por si mesmas, conduzam o magistrado a convencer-se acerca da autoria delitiva” (TJSC, Apelação Criminal n. 0002490-22.2014.8.24.0014, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. 03-11-2022).

Na espécie, as provas angariadas nos autos não se resumem apenas no reconhecimento realizado pela vítima e seu filho.

A vítima Kiara narrou: “Que conseguiu perceber que o acusado tinha barba rala e meio branca e vestia uma jaqueta verde e blusa de moletom com um detalhe vermelho ou laranja e tinha capuz. Que usava o capuz. Que aparentava um senhor de 60 anos. Que seu filho viu e disse que era um senhor de idade e quando mostraram uma fotografia seu filho reconheceu o masculino”.

O menor Caio que: “ele estava com uma jaqueta verde, com detalhes laranja/vermelho no ombro ou no peito (fez gestos) e estava usando um capuz. Que ele não tirou o capuz”.

E, nessa linha, a investigação policial obteve uma fotografia tirada pela Polícia Militar no dia antecedente aos fatos, momento em que o acusado foi abordado fazendo uso de entorpecentes; flagrante fotográfico do qual se percebe que o acusado usava roupas muito semelhante às descritas pelas vítima (evento 1, RELFINAl, fotografia p2 do IP).

Ainda, impende destacar que o pai do acusado, em juízo, além de narrar o martírio sofrido em razão dos furtos e agressões de autoria do filho, disse que o acusado contou no bairro que tinha esfaqueado uma pessoa. Ainda, a testemunha narrou que uma faca de cozinha desapareceu.

Tais fatos foram confirmados pela vizinha do genitor do réu, a testemunha Maria do Carmo Nogueira, a qual disse que o acusado contou que esfaqueou um rapaz em uma briga, mas ela ouviu de outras pessoas que teria sido uma moça. Ainda, que o acusado comentava que sempre carregava a faca e aparecia na sua casa (da depoente) portando-a.

Não se descuide que “o art. 226 do CPP alimenta uma ordenação administrativa, de modo a conferir maior grau de segurança ao reconhecimento realizado pela vítima. Há que se perceber, portanto, que, mesmo que realizado à revelia do procedimento legalmente previsto, o reconhecimento fotográfico pode ser tomado como elemento apto a amparar eventual condenação, ao lado de outros, a depender da realidade do caso em concreto, seguindo avaliação crítica e discricionária do magistrado”. (TJSC, Apelação Criminal n. 0002490-22.2014.8.24.0014, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. 03-11-2022).

No caso vertente, as característica repassada pelas vítimas, ente elas: vestes, barba, calvície, porte físico – somadas com os depoimentos das testemunhas e com o reconhecimento fotográfico, são elementos de provas hígidos para lastrear a condenação do acusado.

Válido destacar que “tratando-se de crime contra o patrimônio, na maioria das vezes praticada sob a clandestinidade, a palavra das vítimas, segundo o entendimento consolidado no âmbito dos tribunais pátrios, assume relevância ímpar, devendo ser levada à máxima consideração quando do processamento judicial de delitos criminais dessa natureza, sobretudo quando respaldada pelos demais elementos colhidos no processado” (STJ, AgRg no REsp 1890479/SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, j. em 08.06.2021).

Por fim, o pleito de desclassificação do delito não merece deferimento, pois, “é irrelevante para a caracterização da tentativa de latrocínio a ocorrência de lesão corporal de qualquer natureza, bastando que o acervo probatório demonstre a intenção do agente em matar a vítima ou terceiro com o fim de praticar ou assegurar a subtração de coisa alheia. Prescindível, portanto, a realização de exame de corpo de delito caso a conduta tenha efetivamente lesado alguém”. (TJSC. ACrim n. 2014.051468-1, julgada em 9/9/2014. Relator: Des. Sérgio Rizelo).

Ao arrimo, mutatis mutandis, cite-se:

“(…) PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE TENTATIVA DE ROUBO SIMPLES (ART. 157, CAPUT, C/C ART. 14, II, DO CP), EM RAZÃO DAS LESÕES LEVES SOFRIDAS POR UMA DAS VÍTIMAS. ALEGADA INEXISTÊNCIA DE RISCO DE VIDA. INVIABILIDADE. ACUSADO QUE AGIU COM A INTENÇÃO DE MATAR. PROJÉTIL DISPARADO EM DIREÇÃO AO ABDÔMEN DO OFENDIDO. NATUREZA DAS LESÕES QUE NÃO IMPEDEM O RECONHECIMENTO DA PRÁTICA DO CRIME DE TENTATIVA DE LATROCÍNIO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0020722-13.2008.8.24.0008, de Blumenau, rel. Volnei Celso Tomazini, Segunda Câmara Criminal, j. 03-04-2018).

No caso em testilha, incontroverso que o acusado, após enfrentar certa resistência da vítima em soltar seus pertences, lhe desferiu facadas no abdômen, ato que sem dúvida demonstra o animus necandi do mesmo. Não se olvide que o réu não realizou ameaças com a arma branca, tanto é que as vítimas não notaram a presença da arma, mas sim agrediu diretamente a vítima com duas estocadas.

Com efeito, afasto o pleito em tela.

Assim, presentes estão todos os requisitos indispensáveis para reconhecer que a conduta empreendida se amolda àquela descrita no tipo penal do art. 157, §3º, II, c/c, art. 14, II, ambos do Código Penal, a condenação do acusado é medida de rigor.

Da aplicação da pena (CP, art. 68)

culpabilidade, observa-se dos autos, está dentro dos padrões normais aos crimes desta natureza. O réu registra maus antecedentes (certidões criminais evento 94). Não há nos autos elementos suficientes para análise da conduta social e da personalidade do acusado. Os motivos são normais à espécie delitiva. As circunstâncias devem ser consideradas normais. As consequências foram graves, isso em razão do abalo psicológico causado ao filho da vítima (conforme relato da vítima, corroborada pela declaração colacionada no evento 82); deveras que “revelam-se acima da normalidade as consequências dos delitos de roubo quando as vítimas informam que, em razão do trauma vivenciado, não conseguem dormir normalmente, necessitando utilizar diariamente calmantes, e que elas revezam turnos de vigília durante a madrugada, para que alguém sempre esteja acordado enquanto o cônjuge dorme” (TJSC, Apelação Criminal n. 5001865-06.2021.8.24.0159, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. 06-12-2022). O comportamento da vítima em nada contribuiu para a prática criminosa.

Assim, considerando duas circunstância negativas, acresço 1/6 na pena-base para cada uma, fixando a pena base em 13 (treze) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, e ao pagamento de 12 (doze) dias-multa.

Na segunda fase de aplicação da pena, ausentes causas atenuantes e presente a agravante da reincidência. Nesse viés, considerando a multirreincidência do acusado (evento 94, certidão 1; 3 e 9, autos n. 0003208-57.2019; 5959972011820041 e 2372320138240038) e, considerando também, que a “jurisprudência tem se utilizado do critério progressivo para aplicação da fração de aumento quando da presença de mais de uma condenação transitada em julgado: 1/6 (um sexto) para uma condenação, 1/5 (um quinto) para duas condenações, 1/4 (um quarto) para três condenações, 1/3 (um terço) para quatro e 1/2 (um meio) para cinco ou mais condenações”. (TJSC, Apelação Criminal n. 0000658-27.2017.8.24.0085, de Coronel Freitas, rel. Des. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, j. 14-11-2019), aumento a pena em 1/4, fixando-a temporariamente em 16 (dezesseis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa.

Na terceira, presente a causa geral de diminuição de pena prevista no art. 14, II, do CP. Nessa trilha, sabe-se que a escolha do quantum deve ser orientada pelo iter criminis percorrido, ou seja, quanto mais o sujeito se aproxima da consumação, menor deve ser a fração de diminuição da pena (1/3), ao passo que, quanto mais distante dela, maior deve ser a atenuação (2/3).

No caso em apreço, o acusado golpeou a vítima e logrou êxito em levar seus pertences, assim, o iter criminis foi percorrido por completo, devendo a redução ser realizada no mínimo (1/3).

Assim, resta a pena fixada definitivamente em 11 (onze) anos,  01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual correspondente a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

Regime do cumprimento de pena (CP, art. 33)

Diante do montante de pena aplicado e da reincidência, fixo o regime fechado para início de cumprimento da pena (CP, art. 33, § 1º, “b”).

Ademais, não preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos insculpidos no art. 44 e no art. 77, ambos do Código Penal, incabível substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, bem como a suspensão condicional da pena.

Manutenção da prisão preventiva.

De largada anoto que a manutenção da prisão preventiva é medida cabível.

Isso porque as certidões de antecedentes criminais acostadas ao evento 94 demonstram que o acusado detêm uma conduta voltada ao cometimento de crimes contra o patrimônio, ostentando multirreincidência específica.

Assim, o acusado faz do crime – especificamente em face ao patrimônio alheio – um meio de vida, razão pela qual sua liberdade afronta à garantia da ordem pública, ante ao iminente risco de reiteração delitiva.

Nesse sentido, cito:

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO (ART. 155, § 4º, INC. I, DO CÓDIGO PENAL). CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA. USO INDEVIDO DE ALGEMAS DURANTE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. NÃO ACOLHIMENTO. MANUTENÇÃO DAS ALGEMAS FUNDAMENTADA PARA GARANTIR A INTEGRIDADE FÍSICA DOS PRESENTES AO ATO. DECRETO CAUTELAR COM FUNDAMENTO NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. REQUISITO DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL DEVIDAMENTE RESPEITADO. RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA. PACIENTE QUE OSTENTA DIVERSAS CONDENAÇÕES ANTERIORES, INCLUSIVE POR PRÁTICA DE CRIME IDÊNTICO, ALÉM DE ESTAR RESPONDENDO A OUTRA AÇÃO PENAL. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DO CÁRCERE CAUTELAR. PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ALTERNATIVAS À PRISÃO, AO MENOS POR ORA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ORDEM DENEGADA.    “A existência de maus antecedentes, reincidência, atos infracionais pretéritos, inquéritos ou mesmo ações penais em curso denota o risco de reiteração delitiva e constitui fundamentação idônea a justificar a segregação cautelar. Precedentes”. (RHC 105.591/GO, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 27/08/2019)  (TJSC, Habeas Corpus (Criminal) n. 4029586-10.2019.8.24.0000, de Lages, rel. Luiz Neri Oliveira de Souza, Quinta Câmara Criminal, j. 17-10-2019).

E ainda:

HABEAS CORPUS. FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO TENTADO E CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 155, § 4º, INCS. I E IV, C/C ART. 14, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL, E ART. 244-B DO ECA). PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. TESES REFERENTES AO TRÁFICO DE ENTORPECENTES. NÃO CONHECIMENTO. ARGUMENTOS ESTRANHOS AO PRESENTE PROCESSO. ALEGADA FALTA DOS REQUISITOS PARA A PRISÃO DOS PACIENTES. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CONFIANÇA DO JUIZ. SEGREGAÇÕES DEVIDAMENTE JUSTIFICADAS. UM PACIENTE COM PROCESSOS EM ANDAMENTO, INCLUSIVE RESPONDENDO POR DELITO PATRIMONIAL, E O OUTRO REINCIDENTE E COM ANTECEDENTES. NECESSIDADE DE SE EVITAR A REITERAÇÃO DELITUOSA. MEDIDA IMPRESCINDÍVEL PARA ACAUTELAR A ORDEM PÚBLICA. APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO QUE SE MOSTRA INSUFICIENTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus (Criminal) n. 4024281-45.2019.8.24.0000, de Chapecó, rel. Des. Alexandre d’Ivanenko, Quarta Câmara Criminal, j. 22-08-2019 – grifado).

Ademais, “não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer em liberdade quando permaneceu segregado durante a persecução criminal, se persistentes os motivos para a preventiva”. (STJ-RHC 92.392/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/04/2018).

Com efeito, considerando que o acusado é contumaz em práticas delitivas, como dito à saciedade na presente sentença, fazendo do crime seus meios de vida, tal cenário autoriza a conclusão de que o risco de reiteração criminosa é elevado, daí a concreta ameaça à ordem pública se prematuramente solto fosse (art. 312 do Código de Processo Penal).

Nessa ordem, mantenho e reedito a prisão cautelar alhures determinada.

Fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração.

No caso em apreço, a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração deve ser buscado no Juízo cível, esfera em que a capacidade econômica do réu, bem como a extensão das danos sofridos pelas vítimas, poderão ser melhor aquilatados.

Dispositivo

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido constante na denúncia e, em consequência, CONDENO o acusado STEFAN ALESSY NOGUEIRA, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos,  01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual correspondente a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 157, §3º, II, c/c, art. 14, II, ambos do Código Penal.

MANTENHO a segregação cautelar do acusado, pois, presentes os motivos autorizadores da custódia cautelar (CPP, art. 312), pelos motivos expostos na fundamentação.

A pena pecuniária deverá ser recolhida na forma preconizada no art. 50 do Código Penal.

Sem custas, pois, assistido pela Defensoria Pública Estadual.

Publique-se. Registre-se. Intime-se. 

Após o trânsito em julgado lance-se o nome do réu no rol de culpados, proceda-se as comunicações de praxe, registre-se a condenação junto ao Cadastro Nacional de Condenados por Improbidade Administrativa e por Ato que Implique Inelegibilidade (CNCIAI); expeça-se mandado de prisão; forme-se o PEC.

Imutável, arquivem-se.


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Código Penal - Pena Restritiva de Direitos
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