Tinturaria e seu proprietário pagarão multa de mais de R$ 100 mil por poluição ambiental

Data:

Poluição Ambiental
Créditos: Petmal | iStock

Uma tinturaria situdada em cidade do Médio Vale do Itajaí, em Santa Catarina, e seu sócio-administrador foram condenados pela prática do crime de poluição ambiental, pelo juízo da Vara Criminal da comarca de Brusque (SC). Ambos pagarão multa, cujos valores somados chegam a aproximadamente R$ 109.000,00 (cento e nove mil reais).

De acordo com a ação penal ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), uma coleta de amostras de efluentes na Estação de Tratamento da Empresa (ETE), realizada em fevereiro de 2019 pela Polícia Militar Ambiental e Fundação Municipal do Meio Ambiente, demonstrou que o parâmetro de materiais sedimentáveis estava em desacordo com os padrões estabelecidos na Resolução CONAMA n. 430/11 e Lei Estadual n. 14.675/20093, e portanto causava poluição hídrica.

De acordo com a prova oral colacionada aos autos, bem como documentação apensada, o juiz de direito Edemar Leopoldo Schlösser considerou certas a materialidade e a autoria dos fatos, pois comprovado que os acusados lançaram resíduos líquidos na natureza, ato responsável por poluição em níveis aptos a resultar em danos à saúde humana e destruição da fauna e da flora.

A tinturaria foi condenada a pena de multa no valor de 60 (sessenta) salários mínimos vigentes à época do efetivo pagamento, e o administrador da empresa, à pena de 1 (um) ano de reclusão em regime aberto. A reprimenda legal foi substituída por uma restritiva de direto consistente em prestação pecuniária no valor de 30 (trinta) salários mínimos.

A decisão é passível de recurso de apelação criminal ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC).

Ação Penal n. 0004380-29.2019.8.24.0011 – Sentença

(Com informações do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC)

Fórum sobre Direito Ambiental
Créditos: Petmal / iStock

SENTENÇA

ESTADO DE SANTA CATARINA
PODER JUDICIÁRIO
Vara Criminal da Comarca de Brusque

Praça das Bandeiras, 55 – Bairro: Centro – CEP: 88350-051 – Fone: (47)3217-8015 – Email: [email protected]

Ação Penal – Procedimento Ordinário Nº 0004380-29.2019.8.24.0011/SC

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RÉU: INDUSTRIAL IRMAOS HORT LIMITADA

RÉU: JULIO HORT

SENTENÇA

Vistos, etc.

INDUSTRIAL IRMÃOS HORT LTDA, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ sob o n. 03.634.530/0001-80, com sede na Rua Ernesto Bianchini, n. 784, Bairro Rio Branco, em Brusque/SC, CEP: 88350-701; e JULIO HORT, nascido em 16 de julho de 1982, com 36 anos de idade na data dos fatos, filho de Marcio Hort e Virgínia Maria Hort, residente na Rua Ernesto Bianchini, n. 784, Bairro Rio Branco, em Brusque/SC, CEP: 88350-701, Rep. Legal da pessoa jurídica Industrial Irmãos Hort Ltda, foram denunciados pelo Ministério Público pela prática do crime previsto no artigo 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98, porque segundo a denúncia, in verbis:

“Consta no procedimento incluso, que, no dia 14/02/2019, por volta das 1h15 min., a Guarnição da Polícia Militar Ambiental, juntamente com o fiscal da Fundação Municipal do Meio Ambiente – FUNDEMA, deslocaram-se à Rua Ernesto Bianchini, n. 784, Bairro Rio Branco, em Brusque/SC1 , com o intuito de coletar os efluentes lançados pela empresa denunciada INDUSTRIAL IRMÃOS HORT LTDA, legalmente representada por JULIO HORT, também denunciado.

O fato decorreu da conduta deliberada do denunciado JULIO HORT, administrador e responsável pela pessoa jurídica e foram realizadas no interesse e benefício da pessoa jurídica INDUSTRIAL IRMÃOS HORT LTDA, o que acarreta a responsabilidade criminal também da pessoa jurídica, posto que decorrente de decisão de seu Representante Legal.

Conforme relato constante no Relatório de fiscalização nº 33237/43387/2019, foi realizado a coleta de amostras de efluentes na Estação de Tratamento da Empresa – ETE, tendo sido verificado poluição hídrica causado pelos denunciados, conforme Relatório de Análise Nº Recebimento 8035/20192 , mediante lançamento de efluentes em curso hídrico inominado, em razão de que o parâmetro Materiais Sedimentáveis estava em desacordo com os padrões estabelecidos na Resolução CONAMA nº 430/11 e Lei Estadual nº 14.675/20093.

Por ocasião dos fatos, a denunciada Industrial Irmãos Hort Ltda, por meio de seu representante legal Julio Hort, causou poluição, com o lançamento de resíduos liquidos, em níveis tais que podem resultar em danos à saúde humana, conforme Relatório de fiscalização nº 33237/43387/2019 e Relatório de Análise Nº Recebimento 8035/20194” (Evento 6).

A denúncia veio acompanhada pela documentação e foi recebida em 26-05-2020 (Evento 27).

Citados (37 e 38), os acusados apresentaram resposta à acusação por meio de defensor constituído, arguindo, preliminarmente, “ausência de interesse processual” e a ausência de justa causa para a deflagração da ação penal (Evento 40).

As matérias preliminares foram afastadas (Evento 42).

Durante a instrução, foram ouvidas uma testemunha de acusação, uma comum e uma de defesa, todas presencialmente. Após, foi interrogado o acusado, por meio do sistema de videoconferência. (Evento 65).

Em alegações finais orais, a acusação entendeu que restaram comprovadas a materialidade do delito, a autoria e culpabilidade do acusado e requereu a condenação nos moldes da denúncia (Evento 65).

A douta defesa, por sua vez, fez suas alegações de forma remissivas, e requereu a absolvição (Evento 65).

Antecedentes criminais registrados aos autos nos Eventos 2, 21 e 63.

Relatados, decido.

Imputam-se aos acusados a prática do crime causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora, através de lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos, previsto no artigo 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98.

A materialidade e autoria do delito estão comprovadas pelo Auto de Infração Ambiental n. 43387-A (Evento 1, TERMO_CIRCUNST2), Termo de Embargo/Interdição ou Suspensão n. 40357-A (Evento 1, TERMO_CIRCUNST3), Relatório de Fiscalização n. 33237/43387/2019 (Evento 1, TERMO_CIRCUNST4 até Evento 1, TERMO_CIRCUNST10), Laudo de Ensaio Físico-Químico (Evento 1, TERMO_CIRCUNST11), Processo Administrativo n. 21220.2019.56499 – Despacho de Penalidade (Evento 1, TERMO_CIRCUNST109), contrato social da empresa Industrial Irmãos Hort Ltda. (Evento 1, TERMO_CIRCUNST45 até Evento 1, TERMO_CIRCUNST50), além da prova oral coletada ao longo da instrução criminal.

Na fase indiciária, Julio Hort disse que é sócio proprietário da empresa Industrial Irmãos Hort Ltda. Que as coletas dos efluentes da estação de tratamento são realizados trimestralmente, conforme parâmetros estipulados pela licença ambiental, por laboratório credenciado. Afirmou que a estação de tratamento foi reformada em 2013, sendo que foram implementadas melhorias (Evento 1, termo circunstanciado 56).

Sob o crivo do contraditório, o acusado declarou que não presenciou a inspeção e coleta do material realizado na estação de tratamento de efluentes da empresa no dia dos fatos. Prosseguiu dizendo que a empresa sempre realizou o tratamento dos efluentes dentro dos padrões exigidos e acredita que a coleta do material naquele dia não foi realizada de maneira correta. Que a empresa foi notificada do resultado e sofreu processo administrativo, com imposição de multa, tendo ofertado recurso administrativo, o qual não restou acolhido. Aduziu ainda, que esta foi a única vez que a empresa foi notificada pelo órgão ambiental pelo fato dos efluentes não estarem dentro dos padrões exigidos. Finalizou dizendo que a empresa já funciona há mais de vinte anos, possuindo em torno de trezentos e sessenta empregos diretos e um faturamento mensal em torno de quatorze a quinze milhões (mídia do Evento 65).

O Agente Fiscal da FUNDEMA, Maicon Eder Lang, relatou perante o juízo que no local foi constatado que a saída dos efluentes estavam dentro dos parâmetros legais. Que na oportunidade foi feito coleta de material pela polícia ambiental para análise em laboratório, mas não sabe o resultado. Que a coleta foi feita na saída da estação de tratamento da empresa, na parte final, no último tanque da estação. Esclareceu ainda que foram usados diversos recepientes próprios para a coleta. Que já fez outras vistorias na empresa, mas nunca fez coleta do material para análise porque aparentemente estava tudo normal (mídia do Evento 65).

A testemunha Valdir Torresani foi ouvida apenas em juízo, ocasião em que afirmou que não estava presente no momento da fiscalização e coleta de material. Destacou ser técnico químico textil  da empresa acusada e responsável pelo tratamento dos efluentes da empresa. Que a análise da água é feita através de laboratório contratado que recolhe as amostras com recepientes próprios na saída da estação e tem 24 horas para o exame. Esclareceu que toda a parte dos resíduos industriais caem nos tanques onde é tratado. Que durante os 22 anos de trabalha a empresa nunca teve uma fiscalização com coleta de material que estivesse fora dos padrões. Concluiu dizendo que teve acesso ao resultado do laudo e lembra que um dos ítens estava fora do padrão (mídia do Evento 65).

Douglas Pereira afirmou ser encarregado de manutenção da empresa acusada, inclusive do tratamento de água. Afirmou que não presenciou a inspeção e coleta do material pela polícia ambiental no dia dos fatos. Que o tratamento dos efluentes da empresa sempre são realizados dentro dos padrões exigidos e que são acompanhados pelo funcionário responsável que tem a responsabilidade de anotar os dados que fogem dos parâmetros legais. Discorreu ainda sobre as instalações da estação de tratamento, reparações e reposições necessárias ao funcionamento regular. Por fim disse que já trabalha na empresa há 22 anos (mídia do evento 65).

Da prova coligida aos autos é possível constatar que a empresa Industrial Irmãos Hort Ltda., cujo representante legal é Julio Hort, lançou, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos, resíduos líquidos na natureza, causando poluição em níveis tais a resultar em danos à saúde humana e destruição da fauna e da flora.

Dispõe o artigo 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98:

“Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:

[…]

§ 2º Se o crime:

[…]

V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:

Pena – reclusão, de um a cinco anos.”

A existência de tal tipo penal se justifica em virtude do mandado constitucional de criminalização insculpido no artigo 225, caput, da Constituição Federal, que prevê que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações”.

Consoante preconiza a Carta Magna, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com vistas à qualidade de vida da população, entende-se além de mero direito de cada cidadão, mas como dever do Estado, que na figura do Magistrado deverá impor as sanções adequadas aos responsáveis pelo cometimento de eventuais infrações penais.

Da prova coligida aos autos, verifica-se que restou cabalmente demonstrada a autoria e materialidade do delito descrito na denúncia.

Imperioso consignar que o crime em comento é formal, o que torna dispensável a perícia técnica para aferição do nível de poluição ou dos danos causados.

De tal modo, sempre que se constatar resíduos fora dos parâmetros normais, e em desacordo com as exigências legais ou regulamentares, tal como no caso dos autos, há risco à saúde humana e ao meio ambiente, importando na prática do crime de poluição.

Em caso análogo, destaca-se que “o delito descrito no art. 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98, segundo entendimento deste Tribunal, independe da ocorrência de dano para a sua configuração. O risco inerente à conduta é presumido pelo tipo penal, de modo que não se exige, para a caracterização do delito, realização da prova pericial para atestar o dano ao meio ambiente ou à saúde humana.” (TJSC, Apelação n. 0019203-64.2008.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 09-08-2016).

A propósito, destaca-se jurisprudência de caso análogo do Tribunal de Justiça Catarinense:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. LANÇAMENTO DE EFLUENTES DE INCUBATÓRIO DE AVES FORA DOS LIMITES DE LICENÇA AMBIENTAL. DELITO DE POLUIÇÃO. ART. 54, §2º, V, DA LEI N. 9.605/1998. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. MAGISTRADO QUE CONSIGNOU A IMPRESCINDIBILIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA PARA CONFIGURAÇÃO DO CRIME PREVISTO NO ART. 54, §2º, V, DA LEI N. 9.605/1998. CRIME FORMAL. DELITO QUE DISPENSA RESULTADO NATURALÍSTICO. SUFICIÊNCIA DA POTENCIALIDADE DO DANO AMBIENTAL NARRADO NA PEÇA ACUSATÓRIA PARA MATERIALIZAÇÃO DO CRIME. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E DA PREVENÇÃO. PRECEDENTES DO STJ E DESTE ÓRGÃO FRACIONÁRIO. “De acordo com o entendimento deste Tribunal, a Lei de Crimes Ambientais deve ser interpretada à luz dos princípios do desenvolvimento sustentável e da prevenção, indicando o acerto da análise que a doutrina e a jurisprudência têm conferido à parte inicial do art. 54 da Lei n. 9.605/1998, de que a mera possibilidade de causar dano à saúde humana é idônea a configurar o crime de poluição, evidenciada sua natureza formal ou, ainda, de perigo abstrato. O delito de poluição ambiental em questão dispensa resultado naturalístico e a potencialidade de dano da atividade descrita na denúncia é suficiente para caracterizar o crime de poluição ambiental, independentemente de laudo específico na empresa”. (STJ. RHC 62.119/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Quinta Turma, julgado em 10/12/2015, DJe 05/02/2016). “O delito descrito no art. 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98, segundo entendimento deste Tribunal, independe da ocorrência de dano para a sua configuração. O risco inerente à conduta é presumido pelo tipo penal, de modo que não se exige, para a caracterização do delito, realização da prova pericial para atestar o dano ao meio ambiente ou à saúde humana.” (TJSC, Apelação n. 0019203-64.2008.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 09-08-2016). MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. ATIVIDADE DE INCUBATÓRIO DE AVES LANÇAMENTO DE INFLUENTES EM TERRENO CONTÍGUO À EMPRESA RÉ. COLETA DE MEDIÇÃO DE AMOSTRA NA ÁREA QUE INDICA ÍNDICE ACIMA DO PATAMAR EXIGIDO EM LEI. ALTA POTENCIALIDADE LESIVA AO LENÇOL FREÁTICO E, POR CONSEGUINTE, À SAÚDE HUMANA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA REFORMADA. DOSIMETRIA. PLEITO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA INCIDIR CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE ESPECÍFICA. ART. 15, II, A, DA LEI N. 9.605/98. ATIVIDADE POLUIDORA DE LANÇAMENTO DE EFLUENTES QUE NÃO FOI PRATICADA PARA AUFERIR VANTAGEM, SENDO REFLEXO DO RAMO COMERCIAL. REJEIÇÃO. DE OFÍCIO DECRETAR A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA FORMA SUPERVENIENTE. INTERSTÍCIO LEGAL TRANSCORRIDO ENTRE OS MARCOS INTERRUPTIVOS RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação Criminal n. 0016056-70.2007.8.24.0018, de Chapecó, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. 28-03-2019). Destaquei.

Apesar das versões apresentadas pela parte acusada e pelo representante legal da empresa, é importante destacar que o Parecer Técnico identificou a existência de parâmetros do efluente coletado em desconformidade com a legislação ambiental, especificamente a quantidade de materiais sedimentáveis (setenta por cento acima do legalmente permitido) que não atendem à Resolução Conama n. 430/2011 e à Lei Estadual n. 14.675/2009 (Evento 1, TERMO_CIRCUNST11).

Ademais, tal parecer foi confeccionado em análise ao Relatório de Análise n. n. 8035.2019, emitido pelo laboratório do Instituto de Tecnologia Senai Ambiental, realizado através das amostras provenientes das coletas efetuadas in loco pelos agentes da Polícia Militar Ambiental o fiscal da FUNDEMA.

Assim, não há que se falar em negativa de autoria, falta ou fragilidade probatória, ou ainda ausência de dolo, porquanto provado que o crime ambiental descrito na denúncia foi praticado pelos acusados, não havendo qualquer causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade, o decreto condenatório é medida que se impõe.

Neste ponto, importante salientar que a responsabilidade da pessoa jurídica não exclui a da pessoa física, conforme dispõe o artigo 3º, parágrafo único, da Lei n. 9.605/98.

Quanto à responsabilidade da pessoa jurídica, de acordo com o disposto no artigo 225, § 3º, da Constituição Federal, “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

Sabe-se também, que a pessoa jurídica não age de per si, mas sim comandada e controlada por seus responsáveis. Deste modo, justifica-se a responsabilização criminal do acusado Julio Hort.

No caso em tela, evidenciado que a conduta típica também foi praticada em benefício da pessoa jurídica, plenamente aplicável sua responsabilização penal, nos termos da fundamentação.

Nestes termos, conforme prova oral coligida aos autos, bem como pela documentação anexada, verifica-se que não resta dúvida quanto à materialidade e autoria, restando assente que os acusados causaram poluição em níveis tais que poderiam resultar em danos à saúde humana, por meio de lançamento de resíduos líquidos, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos, infringindo a norma penal incriminadora.

Com efeito, comprovada a materialidade, autoria e culpabilidade dos acusados e, não havendo causas de exclusão do crime ou isenção de pena, passo a aplicação da correspondente censura criminal.

DA DOSIMETRIA E APLICAÇÃO DA PENA:

Com relação ao acusado Julio Hort:

Analisando as circunstâncias judiciais do artigo 59, do Código Penal, tenho que o acusado agiu com culpabilidade normal à espécie. É primário e não registra antecedentes criminais contra si. A conduta social e a personalidade não restaram melhor apuradas. Os motivos não foram suficientemente esclarecidos. As circunstâncias já foram analisadas, enquanto que as consequências foram normais à espécie. Por se tratar de delito praticado contra a coletividade, resta prejudicado o exame do comportamento da vítima.

Considerando que as circunstâncias judiciais não lhe são desfavoráveis, estabeleço a pena base em um (1) ano de reclusão.

Em relação à segunda fase da dosimetria, tendo em vista que a prática delituosa se deu em período noturno (fiscalização realizada por volta das 1h15 min), deve incidir a agravante do artigo 15, inciso II, letra “i”, da Lei n. 9.605/98, eis que a prática delituosa se deu à noite.

Por outro lado, a agravante deve ser compensada com a evidente atenuante da colaboração do acusado com os agentes encarregados da vigilância e do controle ambiental (art. 14, IV, da Lei n. 9.605/98).

Assim, na ausência de outras circunstancias agravantes ou atenuantes, mantenho a pena intermediária igual a pena base.

Ausentes causas especiais de aumento ou diminuição, pelo que totalizo a pena em um (1) ano de reclusão.

Diante do quantum de pena aplicado e da primariedade do acusado, estabeleço o regime aberto para início de cumprimento da pena  (artigo 33, §2º, ‘c’, do Código Penal).

Com relação à acusada Industrial Irmãos Hort Ltda:

Dispõem os artigos 6º e 21 da Lei n. 9.605/98:

“Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:

I – a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;

II – os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;

III – a situação econômica do infrator, no caso de multa.”

E:

“Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são:

I – multa;

II – restritivas de direitos;

III – prestação de serviços à comunidade.”

Assim, tenho como pertinente a condenação da Industrial Irmãos Hort Ltda. ao pagamento de multa, consistente no valor de sessenta (60) salários mínimos vigentes à época do efetivo pagamento, o que corrresponde a menos de 1% do faturamento mensal, que deverá ser recolhido no prazo de trinta (30) dias, em razão do grau de lesividade da conduta, situação econômica e financeira da empresa, a qual registra um faturamento em torno de R$ 15.000,000,00 (quinze milhões) por mês (Evento 65, VÍDEO2, aos 43m40seg), bem como, diante do caráter sancionatório de finalidades retributiva e preventiva geral e especial.

Ante ao exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia para:

a) condenar o acusado JULIO HORT, já identificado nos autos, à pena de um (1) ano de reclusão, em regime aberto (artigo 33, § 2º, alínea ‘c’, do Código Penal), dando-o como incurso nas sanções do contido no artigo 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98; e

b) condenar a acusada INDUSTRIAL IRMÃOS HORT LTDA, também identificada nos autos, à pena de multa no valor de sessenta (60) salários mínimos vigentes à época do efetivo pagamento, que deverá ser recolhido no prazo de trinta (30) dias, pela prática do crime previsto no artigo 54, § 2º, inciso V, da Lei n. 9.605/98.

Condeno-os ainda, ao pagamento das custas processuais, na proporção da metade para cada um, que deverão ser pagas juntamente com a multa tipo aplicada, no prazo de dez (10) dias após o trânsito em julgado da sentença (artigo 50, do Código Penal).

Considerando que diante das circunstâncias judiciais, se apresenta suficiente, para a reprovação e prevenção do crime, a substituição da reprimenda legal por uma pena restritiva de direito, nos termos do artigo 59 c/c o artigo 43, inciso I e artigo 44, todos do Código Penal, aplico ao acusado Julio Hort:

Prestação pecuniária no valor de trinta (30) salários mínimos vigentes à época do efetivo pagamento, em favor de entidade credenciada junto ao juízo, para depósito em conta única, em trinta (30) dias, mediante comprovação nos autos, nos termos da Portaria n. 02/2012, da Vara Criminal de Brusque, sendo que para a fixação do valor foi levado em consideração a gravidade do fato, extensão do dano ambiental e as condições financeiras e econômicas do sentenciado, empresário do ramo textil, demonstrada nos autos.

Concedo ao acusado Julio Hort o direito de recorrer em liberdade, uma vez que assim esteve durante a lide penal, além de ter a pena corporal sido substituída por restritiva de direitos.

Transitada em julgado a presente decisão, expeça-se PEC definitivo, lance-se-lhe o nome no rol dos culpados e procedam-se as anotações e comunicações necessárias, inclusive ao Cartório Eleitoral (artigo 15, inciso III da Constituição Federal) e a Egrégia Corregedoria Geral de Justiça do Estado.

Apesar do crime ter sido praticado após advento da Lei n. 11.719/08, que alterou a redação do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, na ausência indicativos, deixo de fixar valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração.

Transitada em julgado para a acusação, voltem conclusos para análise da prescrição pela pena in concreto com relação à acusada Industrial Irmãos Hort Ltda.

Cumpridos os desdobramentos da sentença, arquivem-se os autos com as baixas necessárias.

Publicada e registrada eletronicamente, intimem-se.

Documento eletrônico assinado por EDEMAR LEOPOLDO SCHLOSSER, Juiz de Direito, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc1g.tjsc.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, mediante o preenchimento do código verificador 310032458759v49 e do código CRC 5aed97aa.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): EDEMAR LEOPOLDO SCHLOSSER
Data e Hora: 11/10/2022, às 8:51:3

0004380-29.2019.8.24.0011
310032458759 .V49

Poluição Ambiental
Créditos: artisteer | iStock
Juristas
Juristashttp://juristas.com.br
O Portal Juristas nasceu com o objetivo de integrar uma comunidade jurídica onde os internautas possam compartilhar suas informações, ideias e delegar cada vez mais seu aprendizado em nosso Portal.

Deixe um comentário

Compartilhe

Inscreva-se

Últimas

Recentes
Veja Mais

Concessionária de energia é condenada a indenizar usuária por interrupção no fornecimento

A 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação de uma concessionária de energia ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais a uma usuária que ficou sem fornecimento de energia elétrica por quatro dias, após fortes chuvas na capital paulista em 2023. A decisão foi proferida pelo juiz Otávio Augusto de Oliveira Franco, da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Vila Prudente.

Homem é condenado por incêndio que causou a morte do pai idoso

A 3ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a condenação de um homem pelo crime de incêndio que resultou na morte de seu pai idoso. A decisão, proferida pela Vara Única de Conchal, reduziu a pena para oito anos de reclusão, a ser cumprida em regime fechado.

Remuneração por combate a incêndio no Porto de Santos deve se limitar ao valor do bem salvo

A 9ª Vara Cível de Santos condenou uma empresa a pagar R$ 2,8 milhões a outra companhia pelos serviços de assistência prestados no combate a um incêndio em terminal localizado no Porto de Santos. O valor foi determinado com base no limite do bem efetivamente salvo durante a operação.

Casal é condenado por expor adolescente a perigo e mantê-lo em cárcere privado após cerimônia com chá de ayahuasca

A 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a condenação de um casal pelos crimes de sequestro, cárcere privado e exposição ao perigo à saúde ou vida, cometidos contra um adolescente de 16 anos. A decisão, proferida pela juíza Naira Blanco Machado, da 4ª Vara Criminal de São José dos Campos, fixou as penas em dois anos e quatro meses de reclusão e três meses de detenção, substituídas por prestação de serviços à comunidade e pagamento de um salário mínimo.