Idade não pode ser critério para INSS conceder salário-maternidade para indígenas

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Idade não pode ser critério para INSS conceder salário-maternidade para indígenas
Créditos: angkrit / Shutterstock.com

As mulheres indígenas brasileiras que trabalham há mais de 10 meses terão direito ao salário-maternidade, independentemente da idade. Em sessão realizada em agosto do ano passado, a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e determinou que a autarquia não considere o critério etário para deferimento ou indeferimento do benefício.

A ação civil pública pedindo o benefício às índias gestantes menores de 16 anos foi movida pelo Ministério Público Federal (MPF) em setembro de 2014. Segundo o MPF, o INSS vem negando o direito administrativamente, o que seria inconstitucional. A Procuradoria argumenta que as índias são seguradas especiais e geralmente começam a trabalhar junto da família antes dos 16 anos, devendo essa realidade ser reconhecida para fins previdenciários.

Em primeira instância, a 17ª Vara Federal de Curitiba julgou a ação procedente e condenou o INSS a se abster de considerar o critério etário para o deferimento do salário-maternidade às seguradas especiais indígenas.

O INSS recorreu ao tribunal. A autarquia argumenta que o salário-maternidade é substitutivo de remuneração e que a Constituição veda qualquer trabalho para menores de 16 anos. Sustenta que a função do Estado, “considerando-se a gravidez na infância e na adolescência como uma fatalidade, é garantir atendimento médico e assistência tanto para a gestante como para o recém-nascido, independentemente de se tratar ou não de indígena”. O instituto salienta que a decisão pode ter por conseqüência aumentar o número de adolescentes indígenas grávidas.

Para relatora do processo, desembargadora federal Salise Monteiro Sanchotene, a regra que estabelece o limite de idade para trabalhar não pode ser usada para prejudicar adolescentes que efetivamente trabalham. “Embora a idade mínima para o trabalho tenha sido alterada pela Constituição para 16 anos, é público e notório que a realidade pouco mudou, apesar dos avanços socioeconômicos do país”, analisou a desembargadora.

Salise frisou que tanto a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), quanto a Constituição Federal e o Estatuto do Índio ressaltam a necessidade de proteção previdenciária e não discriminação aos indígenas.“Comprovada a maternidade e a qualidade de segurada especial da mulher indígena durante o período de carência, deve ser concedido o benefício de salário-maternidade”, decidiu a magistrada.

A desembargadora observou em seu voto que a Justiça já vem reconhecendo o direito de tempo rural a partir dos 12 anos para fins de aposentadoria, não podendo decidir de forma diferente quando trata de mulheres indígenas.

O período de carência para segurado especial é de 10 meses trabalhando. A decisão é válida para todo o território nacional. Ainda cabe recurso.

Processo:5061478-33.2014.4.04.7000/TRF – Acórdão

Fonte: Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4)

Ementa:

CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. AFASTAMENTO DE REGRA NORMATIVA EM CONTROLE DIFUSO. POSSIBILIDADE. OIT. CONVENÇÃO 169. ESTATUTO DO ÍNDIO. LEI 6.001/73. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PROTEÇÃO SOCIAL. GENITORA INDÍGENA COM IDADE INFERIOR A 16 ANOS. SEGURADA ESPECIAL. SALÁRIO-MATERNIDADE. DIREITO. RECONHECIMENTO. 1. De acordo com Supremo Tribunal Federal, o Ministério Público detém legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos, quando presente evidente relevo social, independentemente de os potenciais titulares terem a possibilidade de declinar a fruição do direito afirmado na ação. 2. No caso, não está em discussão, apenas e tão somente, o direito, e respectivos limites, à concessão de determinado benefício previdenciário. A discussão revela transcendência, delimitando a pertinência da atuação ministerial na tutela de direitos indígenas (art. 129, V da CF), ainda que veicule pretensão de matéria de natureza previdenciária. 3. Mostra-se possível a utilização da Ação Civil Pública, assim como qualquer outro instrumento processual, a fim de obter pronunciamento que declare, incidentalmente, a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, particularmente quando esta declaração constituir-lhe a sua causa de pedir e não o próprio pedido. 4. No presente feito, o pedido do MPF não visa declaração de inconstitucionalidade – em abstrato e com efeito erga omnes – de ato normativo, mas tão somente o afastamento da incidência dos artigos 9º e 11 do Decreto 3.048/99, para que se garanta auxílio maternidade às adolescentes indígenas grávidas e menores de 16 anos. 5. A pretensão veiculada na presente demanda visa, tão somente, à luz dos demais princípios protetivos, que seja desconsiderado o limite de idade como requisito necessário à concessão do salário-maternidade às mulheres indígenas. Inexiste na exordial, portanto, impugnação de ato normativo abstrato que corresponda à ineficácia de qualquer diploma legislativo, de modo que, deve ser rejeitada esta preliminar. 6. Ao cotejar a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, a Declaração das Nações Unidas, a Constituição e Estatuto do Índio – Lei 6001/73, é possível extrair um núcleo básico de proteção social ao trabalho indígena contendo, dentre outras garantias, o direito à não discriminação (direitos trabalhistas e previdenciários em igualdades de condições com não índios e igualdade de oportunidades entre homens e mulheres indígenas e mais desdobramentos quanto ao acesso ao emprego, isonomia salarial, assistência médica e social, segurança e higiene no trabalho, seguridade social, habitação e direito de associação. Logo, a proteção previdenciária, também, impõe-se aos indígenas. 7. A norma do art. 7°, inciso XXXIII, da CF tem caráter protetivo, visando coibir a exploração do trabalho das crianças e adolescentes, preservando o seu direito à educação, ao lazer e à saúde. Não se coaduna, portanto, com a finalidade da lei valer-se dessa regra para negar aos trabalhadores menores direitos previdenciários e trabalhistas reconhecidos aos trabalhadores maiores de idade. 8. Assim, sob pena de estabelecer uma discriminação à mulher indígena impúbere, comprovada a maternidade e a qualidade de segurada especial da mulher indígena durante o período de carência, deve ser concedido o benefício de salário-maternidade. 9. (TRF4 – APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5061478-33.2014.4.04.7000/PR, RELATOR : SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Data do Julgamento: 24.08.2016).

Wilson Roberto
Wilson Robertohttp://www.wilsonroberto.com.br
Advogado militante, bacharel em Administração de Empresas pela Universidade Federal da Paraíba, MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, professor, palestrante, empresário, Bacharel em Direito pelo Unipê, especialista e mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Atualmente é doutorando em Direito Empresarial pela mesma Universidade. Autor de livros e artigos.

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